Isto é História
Aracaju Romântica que Vi e Vivi
Tipos Populares
PEDRO
TELES – ZÉ DENDÊ
Murillo Melins
Pedro Teles foi em sua época um dos tipos mais
interessantes de Aracaju. Participou ativa e alegremente de quase todos os
movimentos culturais de nossa provinciana cidade. ZÉ DENDÊ foi o nome escolhido
por ele mesmo quando começou a encarnar o tipo caipira que fez tanto sucesso
nos primórdios da PRJ-6, Rádio Difusora de Sergipe, e nos palcos dos nossos
cinemas. Era o cômico dos monólogos, dos esquetes, das piadas inocentes ou
picantes e das inteligentes paródias, modificando letras originais de canções
populares, em versões de linguajar de matuto. Registramos aqui algumas delas,
criadas e interpretadas pelo Zé Dendê.
Marcha Militar – tocada nos desfiles militares e
pela Banda Musical da Polícia, quando era marcha, se dirigia ao coreto da Praça
Fausto Cardoso para tocar nas inesquecíveis retretas:
O padre Carlos disse/que é pecado/ficar pelas esquinas/com namorado/andar
de braços dados/sem ser casado/bater coxas dançando/bem rebolado...
Obs. O padre Carlos citado era o Monsenhor Carlos
Carmelo Costa, Vigário da Catedral e eloquente orador sacro e membro da
Academia Sergipana de Letras.
Paródia do Fox-canção “Nada Além” do compositor
Mário Lago.
Madalena:
Madalena peste dos infernos/ai que pena!/você tava inté no meu
caderno./Aquerditei no amô fingido perdido inconoclausto,/o amô só me futuca
porque sou criança.
Sai cangaço não me faça de besta retroço/eu só choro e só bebo/e posso
inté levá a breca,/Madalena satanás de cueca.
Música – Dominó:
Que calor, que calor/que calor/já não posso dormir/dorme nu/dorme
nu/dorme nu/com uma flor na lapela.
Se continuar/e o suor chegar/dorme nu/dorme nu.
E a lapela começa a cheirar.
Canção sucesso de Sílvio Caldas:
É tão grande o mar/e foi um tão grande o home/mas é maior a minha fome/eu
que já não como/estou agora a jejuar – gostosas feijoadas/eu já papei/fritadas
e rabadas/já devorei.
Porém a infelicidade/roubou minha mesada/deixando-me na orfandade/de uma
belíssima fatada.
O estômago vive agora/tocando flauta em surdina/meu Deus eu vou morrer/eu
vou tomar terebentina.
Sofrer não aguento mais/caminho pra centina/porque as tripas
grossas/estão engolindo as finas.
Música – A saudade mata a gente:
Quem namora de noite no escuro/está arriscado a dormir no distrito/é por
isso que estou lhe avisando/pra que depois não vá dar faniquito.
E depois de lá se encontrar/não há mais nenhum jeito pra dar/é por isso
que eu lhe aviso/pra no escuro nunca namorar.
E o soldado não enjeita, morena.../o soldado lhe endireita, morena.../o
soldado leva a gente, morena.../o soldado prende a gente.
Pedro Teles foi o precursor desse gênero chistoso.
Foi um homem jovial que apreciava as artes, o vinho, as belas mulheres e o
humorismo. Com ele andei pelas esquinas e bares, festejando tudo com farras
homéricas. Ele, sem dúvida, muito contribuiu para o enriquecimento da cultura
e, principalmente, da arte cênica de Sergipe.
Criou o grupo teatral “JHALF-PRAN”, que teve atuação
primorosa no espetáculo “Tobias Vive”, peça do professor José Calazans Brandão,
comemorando o cinquentenário de morte do grande sergipano, Tobias Barreto. A
encenação foi a primeira irradiação do gênero em Sergipe, transmitida pela
PYD-2, do Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda (DEIP). Atuaram no
espetáculo Pedro Teles (diretor), João Teles, Jacy Menezes, Helvécio Maia
Filho, João Mello, Antônio Correia e Mattos Pires, os funcionários do DEIP
jornalista Armando Barreto, Virgílio Torres, poeta José Maria Fontes e o então
estudante Fernando Barreto Nunes. O autor José Calazans Brandão dirigiu
pessoalmente a apresentação do espetáculo.
O JHALF-PRAN brilhou por alguns anos no palco do
Salão Nobre do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe e no Cine Teatro Rio
Branco, encenando peças como “Um Homem”, de Eurico Silva, “Ladrão de
Brinquedos”, de Paulo Barreto, a comédia “Casal de Pombos”, dos irmãos João e
Pedro Teles, dentre outros dramas e comédias. O grande sucesso do grupo
deve-se, em parte, à direção artística de Pedro Teles e ao elenco composto por
amigos seus dotados de pendor artístico, como a estrela cantora Jacy Menezes,
João Mello, Mário Pires, Helvécio Maia Filho, Wilson Lima, Alda Diniz, Everton
Valadão, Laurides Lopes, a garota Avany Souza Torres e o pintor e ator J.
Inácio.
Pedro Teles atuou no Teatro do Sítio Betânia, de
Corinto Mendonça, como diretor de cena e participando também como comediante no
espetáculo “Brasil Maravilhoso”, comédia dramática de autoria de João Teles e
Pedro Teles. Foi o idealizador da S.S.C.A – Sociedade Sergipana de Cultura
Artística, cuja posse da 1ª. Diretoria foi registrada em nota do “Jornal
Nordeste” de 9 de setembro de 1941:
Realizou-se ontem, às 20 horas, no salão de conferências do Instituto
Histórico e Geográfico de Sergipe, a posse da primeira diretoria que irá gerir
os destinos daquela sociedade, durante o biênio de 7 de setembro de 1941 à
mesma data de 1943.
Uma grande assistência compareceu a essa solenidade, numa grande
demonstração inequívoca do seu apoio moral a realizações que tais.
A Sociedade Sergipana de Cultura Artística, que foi inspiração do nosso
conterrâneo Pedro Teles, ao qual, também, se associaram várias jovens
inteligentes e cheios de boa vontade, e cuja finalidade é auxiliar o artista
pobre está fadada a grandes sucessos.
O artista popular Pedro Teles (Zé Dendê), além de
tantos atributos, tinha tamanha capacidade criativa para produzir paródias,
aproveitando-se de temas dos grandes clássicos da música popular. Por várias
vezes, antecipava-se ao lançamento local de várias daquelas músicas lançadas no
Rio e São Paulo pelos grandes intérpretes da época, chegando ao ponto do
querido cantor e compositor João Mello reclamar aos amigos que estava ficando
difícil cantar o que hoje são os sucessos da MPB, pois Zé Dendê já
antecipava-se aos originais com suas impagáveis paródias.
Esse foi o alegre, boêmio, irreverente, matuto,
dramaturgo e, acima de tudo, o humano artista, que passou pela vida
distribuindo bom humor e cultura. Era assim Pedro Teles, o Zé Dendê, dos
tradicionais “chavões” e outras “tiradas”, como “Minino fale cum as letra” e
“adeus letra”, artista que conheci e agora tento reverenciar.
-
Na próxima postagem você vai conhecer o PROFESSOR
FRANCISCO PORTUGAL, um baiano de Canavieiras que veio para Aracaju e aqui
fez uma brilhante carreira como professor e tradutor. Apesar de mestre exigente
era um homem bem humorado e que adorava colocar apelidos nos seus alunos em
francês.
-
Do livro “Aracaju Romântica que vi e vivi”, de Murillo Melins, 4ª. Edição,
2011, Gráfica J. Andrade.
-
As imagens aqui reproduzidas foram retiradas do Google.