sábado, 5 de julho de 2014
O Lorde Feudal do Castelo de Papelão
Artigo pessoal
O lorde feudal do castelo de papelão
Clóvis Barbosa
O grande
poeta português Fernando Pessoa dizia que é preciso certa coragem intelectual
para um indivíduo reconhecer que não passa de um farrapo humano, aborto
sobrevivente e louco ainda fora das fronteiras da internabilidade. Num poema
que já foi objeto de uma crônica de minha autoria, aqui no JC, poema em linha reta, escrito pelo seu heterônimo Álvaro de Campos, tido por ele como “o
mais histericamente histérico de mim”, Pessoa diz: “Nunca conheci quem tivesse levado porrada. Todos os meus conhecidos têm
sido campeões em tudo. (...) Toda gente que eu conheço e que fala comigo nunca
teve um ato ridículo, nunca sofreu um enxovalho, nunca foi senão príncipe –
todos eles príncipes – na vida... Quem me dera ouvir de alguém a voz humana que
confessasse não um pecado, mas uma infâmia; que contasse, não uma violência,
mas uma covardia! Não, são todos o Ideal, se os ouço e me falam. Quem há neste
largo mundo que me confesse que uma vez foi vil? (...) Poderão as mulheres não
os terem amado, podem ter sido traídos – mas ridículos nunca!”. Pois bem, o
mundo está cheio desses semideuses que pululam nos galhos da insensatez, da
vaidade, do descalabro ético, da hipocrisia, da indolência e preguiça. Tudo
irmã gêmea da arrogância, característica principal dessa estirpe de gente, que
está em todo lugar, em toda atividade humana, que se vangloria da desonra de
haver ludibriado alguém e de receber honrarias pelos malefícios praticados.
Só e somente ele
é quem é honrado e acredita ser o melhor de todos. Diferentemente dos sábios, recebem
como afronta uma crítica à um equívoco ou a uma estupidez cometida. Quase
sempre são egocêntricos, desonestos e indignos de confiança. Cuidado! Uma
pessoa assim está sempre próxima de nós, no dia a dia, na política, nas artes,
no emprego, nos órgãos de comunicação e em todo lugar. A fama e o poder são os
melhores ambientes de surgimento desse tipo de anômalo. Encantador, ele causa
sempre uma boa impressão. Ele é um Psicopata! Firme-se, entretanto, que me
refiro a psicopata não como o doente mental, ou seja, não
me dirijo aos portadores de distúrbio que afeta o elemento psíquico “percepção”
do mundo real. A deficiência mental é a enfermidade que alcança o psiquismo no
âmbito da “inteligência”. Como exemplo, a tríade oligofrênica: debilidade,
imbecilidade e idiotia. A Psicopatia que faço alusão não é a doença, nem a
deficiência. É a condição, inata e irreversível de comportamento sabido e
consciente do indivíduo, é o termo no significado popular da expressão,
atribuída sempre a quem, sem ser doente mental, tem comportamento antissocial.
Essa turba que
povoa o nosso espaço aumenta cada dia. Quer ver o diabo faça um teste com
alguém que assume o poder. Transforma-se, de imediato. Passa a ser um PhD naquela
atividade. Não interessam as forças, as circunstâncias, os erros do adversário,
a forma como ele chegou ao píncaro, nada! Ele chegou à glória por força da sua
“inteligência”, da sua capacidade de aglutinar e por ser o melhor entre todos.
Não ouse aconselhá-lo ou tentar estabelecer um diálogo num momento de crise. A
resposta é imediata: - eu sou pós-doutor, não preciso de interferência de
ninguém; eu sei como resolver, pois, se não soubesse, não era eu que estava no
poder, mas você. É sempre assim. O poder, para esse psicopata é eterno. Nunca
acaba. Não se mira nos exemplos da literatura, da história, da Bíblia e da
universidade da rua. Sempre olha a plebe de cima para baixo, como ser
inexistente. Pobre de espírito, não sabe o que perde quando deixa de lado a
experiência que se encerra num homem do povo. Alexandre, o Grande, subjugou o
mundo com as suas vitórias em diversas batalhas. Morreu feio, envenenado por um
criado; Xerxes. Filho de Dario I, rei da Pérsia, conquistou o Egito e tentou
fazer o mesmo com a Grécia, pois se achava o dono do mundo. Sofreu uma
fragorosa derrota, fugindo para a Ásia, onde morreu assassinado por um seu
cortesão. O mesmo aconteceu com o poderoso imperador romano Júlio César que em
pouco tempo morreu apunhalado.
O exemplo mais
recente é o de Muammar Gaddafi, também objeto de uma crônica aqui neste
espaço. O seu fim mostra que nenhum
poder foi tão grande que não tivesse sucumbido de forma terrível, como foi o
seu caso, testemunhado por milhões de pessoas. Todos foram e são esmagados pelo
próprio veneno. O veneno da arrogância. Em Tiago, em 4,6 está dito que “Deus resiste aos soberbos, mas concede a
graça aos humildes”, ou seja, o arrogante Deus humilha, mas o humilde Ele
sempre exalta. Todos conhecem a história da escrava Agar. Está ali no Livro do
Gênesis. Por não poder conceber, Sara, mulher de Abrão, propôs-lhe: “Já que o Senhor me fez estéril, une-te à
minha escrava, para ver se, por meio dela, eu possa ter filhos”. Abrão
acordou com a ideia, unindo-se a Agar que lhe deu um filho, só que, durante a
gravidez, passou a esnobar a sua Senhora, pensando possuir um poder que na
verdade não possuía, terminando sendo de forma obstativa expulsa da casa com o
seu filho, tudo fruto de sua estupidez.
Mas na
verdade, esse time de pessoas que se vestem com a roupa da vaidade e da
arrogância, não passa de seres medíocres. Como bem diz José Ingenieros, barcos
de amplas velas, mas desprovidos de timão, não sabem determinar seu próprio
rumo: ignoram se irão varar uma praia arenosa ou arrebentar-se contra um
penhasco. O problema é que eles se sentem felizes, repetindo, sempre, com
toda pavonice, aquilo que o personagem vivido por Al Pacino, em O Advogado do Diabo, diz no final do
filme: Vaidade: meu pecado favorito.
Oxalá que não se acabem como no poema “Vaidade, Tudo Vaidade”, do poeta
português Antônio Nobre: “... Vaidade! Um
dia, foi-se-me a Fortuna e eu vi-me só no mar com minha escuna, e ninguém me
valeu na tempestade”.
Publicado no Jornal
da Cidade, Aracaju-SE, edição de domingo e segunda-feira, 9 e 10 de
dezembro de 2012, Caderno B, página 9.
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