quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015
A Carne é Fraca
Artigo pessoal
A carne é fraca
Clóvis Barbosa
Pois é! Precisava-se de uma explicação lógica
a justificativa que todos têm para os males praticados, principalmente no campo
das anomalias sexuais, ou naquilo que se chama de sexo desregrado. Por exemplo,
um deputado estadual da Bahia vem causando a maior polêmica. Tido como pastor,
responsável pela “Fundação Doutor Jesus”, um centro de reabilitação de
drogados, o parlamentar se diz ex-homossexual, ex-drogado e ex-bandido e que
foi curado pela fé. Numa entrevista a uma emissora de tevê da Bahia, ele
defendeu o seu colega também pastor, deputado federal Marco Feliciano, e
ratificou a tese de que os “africanos são
descendentes amaldiçoados de Noé”. E explicitou: “a viadagem da África, quando viu dois cabras bons, bonitos, musculosos,
saiu atrás” (sic). Ao interpelar uma nota de repúdio contra ele do seu
próprio partido, ele creditou a autoria “aos
viados e viadas lá dentro” (sic). Diz também o deputado-pastor que não teme
represálias do seu partido e explica: “se
essas desgraças (partidos) prestassem, eram inteiros”. Mas sobre o seu
passado, principalmente o fato de ter sido homossexual, ele vacila e justifica:
“O pastor é humano. Claro que eu tenho
medo de recaída. Eu não posso ficar junto de um homem muito tempo porque a
carne é fraca”. A carne é fraca? Vejamos outro exemplo: Um pároco da cidade
de Niterói foi acusado de manter relações sexuais com uma coroinha desde os sete anos de idade, e também com uma sua irmã. O padre nega, mas reconhece que
quando começou a fazer sexo com uma delas a mesma já tinha 18 anos de idade.
Não interessa aqui se a acusação é verdadeira ou não, mas a justificativa do
advogado do padre: “A carne é fraca. O
padre também é um ser humano”. Conversa fiada! Desculpar-se de seus atos sobre
a fraqueza da carne não deixa de ser uma fuga que tem como objetivo escapar da sua
responsabilidade. Aliás, se “a carne é fraca” é porque o espírito é pobre.
Júlio Ribeiro faz parte da história da
literatura brasileira. Da Escola Naturalista, a sua principal e polêmica obra
foi “A Carne”, publicada em 1888, e que aborda temas diversos daqueles
enfrentados pela literatura da época. Recebeu fortes críticas por explorar o
amor livre e a figura da mulher libertária. Conta a história de Lenita, uma
jovem que não buscava o fulgor do romantismo, mas a satisfação dos seus desejos
sexuais. Ao ir residir numa Fazenda de um Coronel, conhece o seu filho,
divorciado, e com ele tem uma tórrida relação entremeada por sexo violento.
Lenira sente prazer ao assistir um escravo ser açoitado e ter o seu corpo
totalmente desfigurado com as feridas. Apesar de o livro terminar numa
tragédia, a sua importância está justamente em enfrentar o tema da fraqueza da
carne. Ribeiro consegue fazer com que ela triunfe sobre os desenganos da mente.
O mais importante ainda é colocar a mulher num papel de vanguarda numa
sociedade conservadora e preconceituosa. Se for verdade o que dizia o
presidente dos EUA, Abraham Lincoln, que pessoas sem vícios não possuem virtudes,
a trajetória de Lenita estaria então justificada? Outro caso impressionante foi
o do terceiro presidente dos EUA, Thomas Jefferson, autor da Declaração da
Independência americana. É dele a seguinte ideia: "A miscigenação de brancos com negros produz
uma degradação com a qual nenhum amante de seu país, nenhum amante da
excelência no caráter humano, pode inocentemente concordar", Pois
não é que se descobriu que Jefferson tinha uma amante, justamente uma escrava,
com quem teve vários filhos e viveu com ela durante trinta e oito anos, quatro
vezes mais do que com a sua legítima mulher. Afinal, a carne é fraca. Outro
presidente dos EUA, Bill Clinton, também se deixou levar pela fraqueza carnal
quando foi acusado de usar uma estagiária para a prática de sexo oral, em plena
Casa Branca.
Diz uma música sertaneja que a carne é fraca e o coração é vagabundo. Adhemar
de Barros foi um dos políticos mais influentes da política brasileira antes da
ditadura militar. Governador de São Paulo por várias vezes teve uma expressão
cunhada que dizia bem do seu comportamento como governante: “O homem que rouba, mas faz”. Casado com
Dona Leonor teve uma amante por vinte anos que mandava e desmandava em seu
governo e no seu patrimônio, Ana Gimol Benchimol Capriglione. Era conhecida
como “Dr. Rui”. Depois da morte de
Adhemar em 1969, Dr. Rui herdou os
seus dólares que foram guardados num cofre numa mansão de Santa Teresa, no Rio
de Janeiro. O maior assalto da história da luta armada brasileira durante o
período de chumbo foi justamente a ação que terminou com o roubo do cofre do
Dr. Rui. Mas o importante aqui é mostrar que Adhemar também se quedou à
fraqueza da carne. Nem sempre as amantes tiveram papel de destaque na vida
política. É o caso de duas mulheres, uma no império romano, outra no século
passado: Valéria Messalina e Elena Ceausescu. Messalina foi a terceira esposa
de Tibério Cláudio César, ele com 50 anos, ela com 15. Apesar dessa diferença
de idade, era uma mulher avarenta, devassa, cruel e assassina. A sua
participação no governo era tão grande que o seu marido foi obrigado a ordenar
a sua execução aos 22 anos de idade. Ela está incluída entre as mulheres mais
perversas da história. Já Elena Ceausescu viveu na Romênia e era casada com o
ditador Nicolae Ceausescu. Era alcunhada de “Mãe da Pátria”. Ao lado do seu marido dirigiu com mão de ferro os
destinos da Romênia durante vinte e quatro anos. Foram acusados de causar a
morte de mais de 60 mil pessoas durante o seu reinado. Elena era uma mulher
cruel, dominadora e era o braço direito do seu marido. Foi fuzilada juntamente
com Nicolae no natal de 1989, encerrando naquele momento o orgulho, a
arrogância e o poder.
A literatura biográfica está cheia de exemplos que justificariam a
fraqueza da carne. No mundo político, é comum o desempenho das amantes na vida
do seu parceiro, participando ativamente da vida profissional do seu amado. O
ditado que diz que por trás de todo grande homem há uma mulher ainda mais
brilhante pode ser encontrada muitas vezes por causa justamente da fraqueza da
carne. Não é atoa que Cristo disse a Pedro “vigiai e orai, para não cairdes na
tentação, pois o espírito está pronto, mas a carne é fraca” (Mateus 26:41).
- Publicado no Jornal da Cidade,
Aracaju-SE, edição de domingo e segunda-feira, 26 e 27 de maio de 2013, Caderno
B, página 5.
- Postado no Blog Primeira Mão,
em 27 de maio de 2013, às 07h49min:
segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015
Mulheres da antiguidade - EUDÓXIA
Isto
é história
Mulheres Audaciosas da Antiguidade
EUDÓXIA
Vicki León
A
imperatriz Eudóxia gostava de ser uma líder espiritual para o povo de
Constantinopla. Era uma agradável variação da rotina da gravidez (três meninas
e um menino em cinco anos) e do marido indolente, Arcádio, imperador da metade
oriental do Império Romano (as pessoas comentavam que ele vivia a vida como um
frouxo – e esses eram os bons comentários). Havia uma nuvem no céu espiritual
de Eudóxia: João Crisóstomo, o arcebispo língua de trapo da cidade, que a
estava importunando em seu show. Ele tinha tido o atrevimento de dizer que as
mulheres só serviam para procriar e que representavam grandes problemas para
qualquer um que estivesse procurando avançar moralmente. Quando ele expulsou Severiano,
um de seus sacerdotes de estimação, Eudóxia ficou furiosa. Ela correu para o
arcebispo na igreja, jogou o bebê Teo, (herdeiro do trono) em seu colo, e
disse: “Se você gosta desse pequenino ser, faça as pazes com Severiano – já!”
Eudóxia venceu.
Tempos
depois, ela cismou com um vinhedo de propriedade de uma pobre viúva e não
conseguiu resistir à tentação de tomá-lo. Crisóstomo (“habilidade não é comigo”)
a censurou violentamente, chamando-a de Jezabel. Durante a rixa, o imperador
manteve um perfil de frouxo, na esperança de que o impasse bispo/esposa
desaparecesse. Eudóxia fez com que Crisóstomo fosse exilado, entretanto, depois
de sua partida, as multidões que antes a idolatravam se manifestaram a favor de
Crisóstomo. Ele voltou, apenas para ser exilado outra vez para a Armênia.
Eudóxia só teve seis meses para se vangloriar. Esgotada com os anos de troca de
palavras amargas, ela morreu em razão de um aborto em 404 a.C.
A autora
Vicki León
- A próxima postagem de Mulheres Audaciosas da
Antiguidade vai falar de “BERURIA”, uma das poucas mulheres judias a ensinar o
Talmude, o texto maciço de comentários do Torá, ou escritas sagradas do Velho
Testamento. Ela viveu na Palestina no século II d.C., durante o reinado do
imperador Adriano. Ela é autora da célebre frase: “Deus quer a destruição do
pecado, não dos pecadores”.
– Do livro “Mulheres Audaciosas da Antiguidade”,
título original, “Uppity Women of Ancient Times”, de Vicki León, tradução de
Miriam Groeger, Record: Rosa dos Tempos, 1997.
- Todas As imagens foram extraídas do Google.
segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015
Avenida Paulista
Artigo pessoal
Avenida
Paulista
Clóvis
Barbosa
O professor Norberto Bobbio escreveu um
pequeno opúsculo, chamado “O Futuro da Democracia – Uma defesa das regras do
jogo”, onde ele alerta que o respeito às normas e às instituições da democracia
é o primeiro e mais importante passo para a renovação progressiva da sociedade,
inclusive em direção a uma possível reorganização socialista. O respeito a quem
não pensa como nós, a quem não compartilha dos mesmos propósitos, é conditio sine qua non para começar a pensar
democraticamente. A democracia não é o progresso de alguns em detrimento a outros, mas o de todos com ajuda de todos.
Sabe-se que a democracia é um regime por realizar-se. Não está acabado. Afinal,
nós, brasileiros, após a República, não tivemos tempo de emplacar o modelo por
muito tempo. Os períodos autoritários representados pelo Estado novo e pela
ditadura militar obstaram qualquer possibilidade de avanço. Tudo bem que a
democracia, do ponto de vista filosófico, para além de ser uma forma de governo
é a procura da vida em comum. Mas, se é assim, é bom saber e entender que
nossas atitudes não podem ferir ou ofender o próximo por qualquer motivo.
Aliás, já se disse que uma sociedade democrática, paradoxalmente, é “uma
sociedade de iguais que são diferentes”. Por outro lado, frise-se, com letras
garrafais, que não se quer aqui cercear o direito de greve, mas ele não é
incompatível com o respeito ao direito de outrem. Daí porque é interessante
conhecer um espaço de quase 3 km que se tornou um dos pontos mais
característicos da cidade de São Paulo: a Avenida Paulista. Confesso que adoro
percorrê-la de cabo a rabo, indo pelo lado direito e voltando pelo esquerdo.
Nas idas e vindas, adentrando as livrarias, a Martins Freitas e a Cultura. Indo
ao MASP, passando pelo Parque Trianon: em plena selva de pedra surge uma área
verde remanescente da Mata Atlântica, que resplandece, dando um glamour sem igual à artéria.
Sigo
adiante. Conjunto Nacional, prédio da FIESP, Instituto Pasteur, Casa das Rosas,
Hospital Santa Catarina, bancos, restaurantes, consulados da África do Sul,
Argentina, Líbano, Mônaco, Japão, Suíça, República Dominicana, Síria, Itália,
França e outros países, hotéis, Colégios, as estações metroviárias da
Consolação, do Trianon-MASP, do Brigadeiro Luiz Antônio, e o vai-e-vem
constante de pessoas, pelos seus calçadões formatados por um desenho preto e
branco. A minha relação com a Avenida Paulista desta vez foi diferente. Quis
conhecê-la a noite. O vai-e-vem de pessoas não pára e adentra a madrugada. Guetos
são formados por toda a avenida. Grupos de rock, cantores de rua, músicos,
boêmios, mendigos, garotos de programa, prostitutas, travestis, casais
apaixonados, heterossexuais ou homossexuais, os bares sempre cheios. O calçadão
do Banco Safra reúne gente de todos os lugares. Faz frio. De repente,
preguiçosamente, o dia amanhece e nova paisagem surge. É domingo. Uma feira de
antiguidades é montada no vão livre do Museu de Arte de São Paulo, o MASP. Os
ciclistas começam a surgir pelo canteiro central entre a Bela Cintra e a Rua da
Consolação. Pedalam lentamente vivenciando a poesia que encerra o logradouro
ícone de um povo. São Paulo é uma cidade fascinante. Qualquer evento, marcado
para qualquer hora do dia ou da noite tem público. Lembro-me da presença da
nossa Orquestra Sinfônica no espaço da Federação das Indústrias do Estado de
São Paulo, a FIESP, em 2008, em plena Avenida Paulista. O espetáculo estava
marcado para o meio-dia de um domingo. Auditório repleto. Ingressos esgotados e
muita gente de fora pleiteando uma nova apresentação. A democracia vive
extenuamente na Avenida Paulista com todas as tribos perfilando e se
respeitando. Os espaços são ocupados sem a necessidade de prejudicar o outro. O
fascínio da Avenida Paulista é justamente pela forma plural que recebe a todos.
-
Publicado no Jornal da Cidade,
Aracaju-SE, edição de domingo e segunda-feira, 15 e 16 de maio de 2013, Caderno
A-7.
-
Postado no Blog Primeira Mão,
Aracaju-SE, em 13 de maio de 2013, segunda-feira, às 00:39:09 –
http://www.primeiramao.blog.br/post.aspx?id=5688&t=avenida-paulista
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