Aracaju/Se,

terça-feira, 24 de abril de 2018

A Origem do Mal

Opinião pessoal
A Origem do Mal
Clóvis Barbosa
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No final de janeiro foi realizado em Aracaju um seminário comemorativo aos 90 anos de Dom Luciano Duarte. A promoção foi do Instituto Dom Luciano Duarte e do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. Durante três dias tivemos lançamentos de livros do homenageado, conferências abordando temas de filosofia, educação, história da igreja e um debate sobre a figura desse grande sergipano e brasileiro. Gostei de tudo que vi, mas me chamou atenção a conferência de abertura que teve como painelista o professor Doutor Paulo César Nodari, da Universidade de Caxias do Sul, que abordou o tema “Kant e o problema do mal radical”. Passei a refletir sobre a matéria e a perquirir a mim mesmo sobre a origem do mal e de tudo que já li a respeito na filosofia, na literatura e na Bíblia. Todos conhecem o Hino da Criação do Universo. Ali está dito que Deus criou o céu e a terra, as águas do mar, a noite e o dia, plantas que geram sementes, árvores frutíferas, seres vivos nas águas e pássaros que voam abaixo do firmamento, animais domésticos, pequenos e selvagens, segundo suas espécies, monstros marinhos, e seres humanos à sua imagem e semelhança. Tudo, portanto, foi criado por Deus. E arremata a Bíblia que tudo que Deus criou é bom, especialmente o ser humano – homem e mulher -, coroamento da criação. Depois dessa sentença bíblica, começam a fervilhar as perguntas que não saem da cabeça: se Deus foi o criador de tudo, o mal também foi criado por Ele?  Por que existe o mal? O bem e o mal são intrínsecos à natureza humana? O mal é uma criação do meio em que se vive? O que é na verdade o bem e o mal? Por que Deus tolera o mal? Como nasceu o mal?  São perguntas para reflexão diante de um mundo de predomínio da maldade. De um mundo onde cada vez mais o homem faz questão de mostrar seus instintos mais primitivos. Aliás, na própria Bíblia, Habacuque questionou Deus sobre o mal: Tu [Deus] és tão puro de olhos, que não podes ver o mal, e a opressão não podes contemplar. Por que olhas para os que procedem aleivosamente, e te calas quando o ímpio devora aquele que é mais justo do que ele?
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Sei do perigo de fazer tantas perguntas. Há cerca de 2.400 anos, em Atenas, por perguntar demais, um homem foi condenado à morte, obrigado a tomar veneno preparado com cicuta: Sócrates. Aliás, para ele, o mal seria resultado da ignorância, não teria existência real e, assim, o homem sábio deveria superá-lo. Mas, a sua morte, ao contrário do que se imaginava, fez estimular na história da filosofia o pensamento perquiridor. Epicuro, por exemplo, filósofo grego que nasceu no ano 341 e morreu em 270 a.C., sobre o mal moral, ou seja, o mal causado pelos seres humanos, questionava como poderia um Deus bom e todo-poderoso admitir o mal? Ora, segundo ele, se Deus não pode impedir que isso aconteça, então não é verdadeiramente todo-poderoso. Mas foi Santo Agostinho quem defendeu a tese de que a origem do mal estaria no livre-arbítrio concedido por Deus. Todo mal, para ele, seria resultado do livre afastamento do bem. O mal, destarte, seria a ausência do bem. Durante muito tempo se acreditou que a bondade vinha da alma e o mal do corpo, com todas as suas contradições. E mais ainda, a religião maniqueísta explicava a existência do mal diante do confronto de duas forças antagônicas, uma representando o bem, Deus, outra o mal, o Diabo. Ambos seriam fortes e nenhum deles conseguiria destruir o outro. Embora maniqueísta na sua juventude, Santo Agostinho se afastou dessas teses ao tentar explicar o motivo de Deus permitir o sofrimento em decorrência da prática do mal. Para ele, ao receber o livre-arbítrio, teria o homem o poder de escolha. Santo Tomás de Aquino repete Santo Agostinho, e vê o mal como ausência do bem. Num momento em que a igreja associava o mal à imagem do demônio e do pecado, Jean-Jaques Rousseau revolucionou a discussão da matéria, ao enunciar “que a primeira fonte do mal é a desigualdade” e que “O homem nasce livre, e em toda parte é posto a ferros. Quem se julga o senhor dos outros não deixa de ser tão escravo quanto ele”. Essa visão de que o homem nasce bom e a sociedade é que o corrompe criou muitos problemas para ele, já que esse entendimento ia de encontro aos valores da época, principalmente aqueles defendidos pela igreja.
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A obra de Rousseau está consolidada em Discursos sobre as Ciências e as Artes, Discurso sobre a Origem da Desigualdade, O Contrato Social, Emílio e As Confissões e é tida como importante na história da filosofia política. Para Kant, o mal está enraizado na natureza humana diante do poder de escolha que o homem tem para decidir o que fazer, ou como afirmado: (...) o fundamento do mal não pode residir em nenhum objeto que determine o arbítrio mediante uma inclinação, em nenhum impulso natural, mas unicamente numa regra que o próprio arbítrio para si institui para uso da sua liberdade, i.e., numa máxima. Em outras palavras, Kant entende que o bem é um imperativo categórico e tudo que vai de encontro a ele seria o mal. O espiritismo também defende a pureza da alma e que nela está armazenada bilhões de anos de existência. Para essa doutrina a origem do mal estaria na consciência do homem e na sua convivência com o bem, este sempre eterno e aquele temporário. Para os Espíritos da Codificação Espírita, o bem é tudo o que é conforme a lei de Deus, e o mal é tudo o que dela se afasta. Allan Kardec, no Livro dos Espíritos, diz: [...] os Espíritos foram criados simples e ignorantes. Deus deixa ao homem a escolha do caminho. Tanto pior para ele, se toma o mau caminho: sua peregrinação será mais longa. Se não existissem montanhas, o homem não compreenderia que se pode subir e descer; e se não existissem rochas, não compreenderia que há corpos duros. É preciso que o Espírito adquira experiência e, para isso, é necessário que conheça o bem e o mal. [...]O pensamento humano e a ideia do mal tiveram o seu ponto máximo na descoberta do inconsciente por Sigmund Freud, onde grande parte das nossas ações é movida por desejos recônditos.
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Retorno a Kant, que pertenceu ao grupo que defendia uma das matrizes do sistema ético, a chamada deontologia, onde os princípios é o que importa. Se a regra é “não matarás”, “não roubarás”, “não mentirás”, viola o sistema quem as descumprir, pois amparadas por ideais universais. Entendo que o desrespeito à dignidade da pessoa humana é o mal que atinge o princípio fundamental da moral, pouco importando se esse mal pertence ou não à natureza humana e tem nela a sua origem. E para o leitor, o que é o mal?

Post Scriptum
A promessa
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Naquele fim de manhã, a Estação da Leste Brasileira, na Praça dos Expedicionários, estava repleta de passageiros e seus parentes. Aguardavam a viagem para Salvador pelo “Estrela do Norte”. Dentre outros, oito amigos, todos jovens, estavam indo à capital baiana para estudar preparatórios nos cursos de medicina e direito. Artagão estava entre eles e era considerado o mais despreparado culturalmente. Sabiam que era uma perda de tempo e de dinheiro dos seus pais a sua viagem para estudar na Bahia. De uma coisa, contudo, todos os seus amigos concordavam: Artagão, apesar de feio, era muito expansivo e tinha certa facilidade em fazer amizades e conquistar mulheres. Embarcaram e as estações do interior foram ficando para trás, até chegarem à Estação da Calçada, em Salvador. Os sergipanos foram morar na Pensão de Dona Zizi, no Largo da Graça. Um grupo foi estudar num curso preparatório de medicina, outro num de direito. Artagão se matriculou, mas pouco comparecia à sala de aula. Só queria viver no “Mangue do Maciel”, no Pelourinho, onde se amasiou com uma pernambucana de nome Jurema. Não adiantava os conselhos para que ele se dedicasse às aulas. Aproximando-se os exames, no último mês do curso, Artagão passou a frequentar as aulas. Ninguém acreditava nele. Certo dia, ele perguntou o que deveria fazer para passar na Faculdade de Direito. Gonçalo, que era um papa-hóstia, aconselhou-lhe: - Só tem um jeito. Vá à Colina e faça uma promessa para o Senhor do Bonfim, que é um santo milagreiro. Ele levou o conselho a sério. Pegou um bonde na Praça Cayru e seguiu para o Bonfim. Ele prometeu que se passasse nos exames da Faculdade de Direito, iria de joelhos da Igreja da Conceição da Praia até a Colina, um trajeto de cerca de 6 km. Disse aos amigos da promessa feita e, claro, ninguém acreditava na sua vitória. E não é que Artagão passou nos exames?! E já estudando direito, os colegas começaram a cobrar o pagamento da promessa e nada dele cumpri-la. Depois de uma peroração de Gonçalo e de Dona Zizi sobre as consequências do seu ato, do ponto de vista religioso, ele se conscientizou do pagamento da dívida. Num sábado, logo cedo, ele acordou os colegas e Dona Zizi e disse para todos: - Chegou a hora, vou pagar a promessa agora. E numa prova de solidariedade todos foram para a Igreja da Conceição da Praia, para acompanhá-lo pelas ruas da cidade baixa até chegar ao Bonfim. Dona Zizi preparou uma dúzia de toalhas entorpecidas com água de cheiro e distribuiu balangandãs entre os meninos. Ao chegarem no local, Artagão pegou um táxi, ajoelhou-se no banco de trás e seguiu para o Bonfim, deixando os amigos atônitos.

- Publicado no Jornal da Cidade, Aracaju-SE, edição de domingo à quarta-feira, 15 a 18 de fevereiro de 2015, Caderno A-7.
- Postado no Blog Primeira Mão, dia 15 de fevereiro de 2015, às 19h05min, conforme site:

               

quinta-feira, 5 de abril de 2018

Mulheres da Antiguidade - Boadiceia


Isto é História
Mulheres Audaciosas da Antiguidade
BOADICEIA
Vicki León
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Raramente os nomes de batismo acabam servindo como uma luva para as pessoas; entretanto, no século I d.C., Britânia sabia o que estava fazendo. Ela chamou sua pequena princesa de Boadiceia, ou “a vitoriosa”, e atingiu bem no alvo. Da maneira como as coisas se desenvolveram, “açougueira” também teria funcionado, mas estou botando a carruagem na frente dos cavalos.  
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Boadiceia cresceu, transformando-se numa esplêndida bretã com uma cascata de cabelos castanho-avermelhado até a altura dos joelhos. Ela se casou com Prasátago, rei da tribo icênia, que dominava a área ao redor do que hoje em dia corresponde a East Anglia, na Inglaterra. Logo no início do seu casamento, os icênios se enredaram com os romanos, mas as notícias realmente ruins começaram em torno de 59 d.C. Prasá morreu, deixando metade de suas terras e riquezas para suas duas filhas e a outra metade para o imperador Nero. A herança era um dinheiro pago em troca de liberdade, um odioso costume iniciado pelos imperadores romanos para reabastecer os cofres que eles haviam esvaziado com outras coisas, como perfumes e banquetes. O suborno não funcionou. O governador romano da ilha tomou as terras icênias de qualquer maneira, deu uma surra de chicote na rainha Boadiceia, e estuprou suas duas filhas como uma medida extra mal calculada.
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Ora, todos sabem que não se deve brincar com uma ruiva, principalmente uma mãe de 1,82metros de altura que acabou de ficar do lado errado de um chicote de nove tiras. Num piscar de olhos Boadiceia vestiu seu equipamento de batalha de desenho exclusivo – uma túnica multicolorida, um colar trançado de ouro e uma lança combinando – e reagrupou aproximadamente 100 mil celtas furiosamente enlouquecidos, muitos deles mulheres, de tribos ao redor do leste da Inglaterra. Liderando a horda em sua carruagem de guerra equipada com lâminas de foice nas calotas, Boadiceia iniciou o ataque. Começando onde hoje está Colchester, ela foi metodicamente abrindo seu caminho para o sul, matando os cidadãos numa variedade de maneiras horríveis e dolorosas, depois incendiando as aldeias à medida que passavam. Em seguida, massacrou os 20 mil habitantes de Londinium (as cinzas de sua fogueira ainda hoje podem ser vistas em Londres). No entendimento de Boadiceia, sua conta de uns 70 mil corpos romanos não era nada mais do que um massacre justificável.
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Só depois que seu exército alcançou os condados centrais da Inglaterra é que novas tropas romanas conseguiram impedir seu avanço furioso. Algumas delas tinham estado ocupadas lutando contra outras mulheres frenéticas na fortaleza druida de Mona. Embora os celtas superassem os romanos em número, quatro para um, os bretões de Boadiceia perderam na estratégia e foram massacrados. A rainha (e suas filhas – cujos nomes ainda não sabemos) tomaram veneno antes que os romanos pudessem lhes botar as mãos outra vez. Seu feito rebelde teve, a curto prazo, consequências positivas para os bretões que restaram. Uma comissão encarregada de apurar os fatos em Roma apressadamente instituiu uma política mais humana para a ilha. Ironicamente, essa nova política mais branda possibilitou uma romanização dos icênios e de outras tribos muito mais rápida do que o governo com mão de ferro anterior havia conseguido.      

Dorcas
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Nascida escrava no círculo doméstico da família do imperador na ilha de Capri, Dorcas recebeu a atenção de Lívia, a imperiosa mãe de Tibério. Com uma velocidade vertiginosa, ela estava a caminho de Roma para se tornar uma ornamentadora de estrelas.  A imperatriz Lívia devia adorar fazer as coisas por Dorcas. Se não fosse assim, essa perita cabeleireira não teria durado uma semana. Conhecida como a maior força nocauteadora por trás dos bastidores da política romana, a longeva Lívia tinha uma queda para encurtar a duração de vida dos outros, de criados desajeitados a membros da família que por acaso se tornassem um obstáculo no seu caminho. Dorcas deve ter ganhado boas gorjetas – ou sabia algo incriminador sobre Lívia, porque foi libertada e se casou com um funcionário de plebiscito chamado Licastos, um sujeito decente que a tratava com carinho, e que mais tarde deixou gravados em seu túmulo orgulhosos elogios às qualidades dela. Lívia também foi bem-sucedida, recebendo o status de deusa poucos anos após sua morte, a despeito do número indecoroso de partidas prematuras deste mundo creditadas a ela.

- A próxima postagem de “Mulheres Audaciosas da Antiguidade” vai falar de POPEIA SABINA. Ela viveu nos anos 60 d.C. Casou-se com o imperador Nero e teve uma participação ativa nas maldades do marido. Mantinha um amante, Oto, que se dava muito bem com Nero.
- Do livro “Mulheres Audaciosas da Antiguidade”, de Vicki León, tradução de Miriam Groeger, Editora Rosa dos Tempos.
- As imagens aqui reproduzidas foram retiradas do Google. 

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