Aracaju/Se,

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Os Parasitas Humanos


Artigo pessoal


Os parasitas humanos
 Clóvis Barbosa

Você conhece algum indivíduo com as características de frio, calculista, mentiroso, inescrupuloso, dissimulado, sedutor e egoísta? Assim mesmo, sem tirar nem pôr qualquer um desses “atributos”? Sim? Então se prepare, você está diante de um predador social, de um vampiro de almas, de um psicopata. Ele é totalmente desprovido de consciência, de senso moral, na sua vida em sociedade. Só se inteira com outras pessoas quando vê perspectiva de melhoria de sua condição social. Em casos mais graves, é capaz de tudo, até de matar com violência e crueldade, tendo esse distúrbio de conduta origem epiléptica. Para tanto, tem metas definidas e, para atingi-las, atropela quem estiver em sua frente, sem qualquer sentimento de culpa, de angústia ou de conflito interno. Quase sempre se aproxima das pessoas de forma comedida, agradável, educada, solidária, sem demonstrar qualquer tipo de interesse. No momento que ganha confiança começa a colocar em prática os seus planos.

Esquirol
                                 
A literatura psiquiátrica não considera os psicopatas nem loucos, nem normais. São os chamados criminosos fronteiriços. E por que não são loucos? Porque a sua conduta exclui a idéia de ausência de inteligência e a presença de alucinações ou delírios. Normalmente, são lúcidos e talentosos. Esse tipo de conduta foi primeiramente chamado de “monomania instintiva ou impulsiva” e quem a definiu foi Esquirol em 1810. Mais tarde, em 1835, passou a ser chamado de “loucura moral” por Pritchard, que o definiu como “indivíduos nos quais existe uma perversão do sentimento, do temperamento, da tendência, dos hábitos e da ação, sem irregularidade na faculdade intelectiva. Essa loucura do sentimento consiste na unilateral e circunscrita atrofia do senso moral, com consequência sobre a conduta”. Em 1858, passou a ser chamada como “enfermidade do caráter”, em 1888, de “inferioridade psicopática” e de “loucura lúcida”. Cesare Lombroso, no fim do século, XIX, em sua obra “L’uomo delinquente”, uniu a “loucura moral” de Pritchard ao seu “delinquente nato”, mas, quem primeiro falou em “constituição psicopática” foi Emil Kraepelin, no começo do século XX, e logo depois evoluiu para “personalidade psicopática”. A verdade, entretanto, é que no decorrer do tempo o termo psicopata passou a ser sinônimo de distúrbio de comportamento, indivíduo antissocial, condutopata, sociopata, distúrbio de conduta, etc.
 
Não resta a menor dúvida que o número de psicopatas que não matam é muito superior aos que praticam crimes violentos. Mas saibam que os que não matam não são inofensivos. Os exemplos são inúmeros e agem das formas mais variadas. F é um homem de prestígio, charmoso, atraente e faz sucesso com as mulheres. Tem, contudo, uma tendência para o logro. Conheceu e namorou duas mulheres, colegas de profissão. Na primeira, após ganhar confiança e fazê-la apaixonada, começou a lamentar que o seu maior desejo era conhecer as ilhas gregas, porém, não tinha condições financeiras, já que o seu dinheiro era praticamente destinado para prover a criação e educação dos seus sobrinhos órfãos no interior do Estado. Ela fez-lhe uma surpresa e apareceu com duas passagens e estadia de 15 dias pelas paradisíacas praias da Grécia ao seu lado. Após o retornar depois de uma lua-de-mel cheia de amor, antes mesmo de desembarcar no seu destino, ele rompeu o relacionamento alegando que descobriu que nada sentia por ela. No segundo caso, a vítima foi outra colega de profissão que, após enamorar-se dele, pegou todas as suas economias e investiu num palacete a beira mar que ele registrou em seu nome. Após a construção, ele não mais a procurou e evitou qualquer tipo de envolvimento emocional. C estava separada há um ano e conheceu numa festa F, que se dizia ser advogado. Tinha um sorriso contagiante, amável e à proporção que ela o conhecia apaixonava-se cada vez mais. Os amigos dela sempre a parabenizava pelo homem que estava ao seu lado, aquele que toda mulher sonha. Fazia todos os seus caprichos e nunca alterava a sua voz. Depois da confiança conquistada e da paixão aguda dela, ele quis trocar de carro e convenceu a namorada a emprestar-lhe o dinheiro, toda sua economia, pois ele estava prestes a receber honorários de um grande cliente. Ela tirou toda a sua poupança e emprestou a ele, que depois disso, desapareceu, nunca mais dando sinal de vida. Descobriu depois que ele nunca foi advogado e que nunca trabalhou e vivia de trambiques.
Há o tipo também que vai lhe pedir emprego e diz logo: “estou desempregado, preciso trabalhar, não interessa quanto vou ganhar, pode ser o mínimo”. Nos primeiros três meses ele sente gratidão por você, mas a partir daí começa a questionar o salário que ganha e passa a culpá-lo pela sua situação. Passa a ser o seu inimigo e por onde passa só tem palavras ofensivas ao seu benfeitor. Tem também aquele que se aproxima de você e lhe conquista com a sua inteligência. Depois que ele atinge o seu objetivo, desaparece completamente. E se você negar um seu pedido, se prepare porque você vai ser achacado de todas as ofensas morais existentes.
 
Sobre o tema, bastante interessante o livro da psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, lançado em 2008 pela Editora Fontanar, “Mentes Perigosas – O psicopata mora ao lado”, embora esteja catalogado como obra de auto-ajuda, numa linguagem simples e acessível, ela aborda com muita precisão o comportamento desses tipos e retrata uma série de exemplos do nosso cotidiano. Ela fala: “Os psicopatas são os vampiros da vida real. Não é exatamente o nosso sangue que eles sugam, mas sim nossa energia emocional. Podemos considerá-las autênticas criaturas das trevas. Possuem um extraordinário poder de nos importunar e de nos hipnotizar com o objetivo maquiavélico de anestesiar nosso poder de julgamento e nossa racionalidade. Com histórias imaginárias e falsas promessas nos fazem sucumbir ao seu jogo e, totalmente entregues à sorte, perdemos nossos bens materiais ou somos dominados mental e psicologicamente”. O bom do livro é que você aprende a conhecer de perto esses tipos. Eles estão próximos de nós, no trabalho, na escola e em toda atividade humana. É bom se precaver,
 
Já o crime violento praticado pelos psicopatas, tem, no mínimo, quatro elementos dentre estes sete característicos: 1) multiplicidade de golpes; 2) ausência de motivos plausíveis; 3) instantaneidade na execução; 4) falta de remorso; 5) ferocidade na ação; 6) amnésia ou reminiscências mnêmicas confusas; e 7) falta de premeditação. Portanto, Cuidado com as lágrimas de crocodilo. Aquelas que o réptil exala após comer sua presa. Cuidado com os psicopatas. Ele pode estar, agora, do seu lado.

  1. Publicado no Jornal da Cidade, Aracaju-SE, edição de domingo e segunda-feira, 13 e 14 de maio de 2012, Caderno B, página 11.
  2. Publicado no Blog Primeira Mão, postado em 13 de maio de 2012, às 16:47 horas. http://www.primeiramao.blog.br/post.aspx?id=3718&t=coluna-de-clovis-barbosa---os-parasitas-humanos

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Mulheres da antiguidade - Cleópatra VII

Isto é história
Mulheres Audaciosas da antiguidade
CLEÓPATRA VII
Vicki León
 
Famosa como uma glamourosa e assídua frequentadora de festas, e como grande maquinadora, Cleópatra VII também era uma intelectual, linguista e excelente mãe. Nascida em 69 a.C., de um Ptolomeu flácido que tinha o apelido  de “o tocador de flauta”, essa Cleo não perdeu nada através da endogamia. Inteligente e motivada, ela adorava ler, tirando um prazer sensual da literatura e absorvendo idiomas como uma esponja. Na época em que ela e seu irmão, Ptolomeu XIII, começaram a reinar, ela falava grego, hebraico, árabe, persa e egípcio – a única rainha em trezentos anos a aprender a língua local. 
 
Júlio César

Júlio César veio ao Egito (que naquela época era independente, mas, gananciosamente cobiçado pelos romanos e outros) à procura de apoio e qualquer dinheiro que estivesse sobrando, e, em vez disso, encontrou uma sensualíssima gata poliglota. A atração que ele sentiu colocou Cleo no banco do motorista. Em um ano, ela deu à luz Cesário, filho de Júlio César, e, convenientemente, Ptolomeu XIII morreu. Cleópatra então casou com Ptolomeu XIV, seu irmão de doze anos. O ano 45 a.C. foi um ponto culminante: Cleo vivia abertamente como amante de César em Roma e até mesmo teve sua estátua colocada no templo de Vênus. Entretanto, os romanos não gostaram nem um pouco disso, e logo planejaram uma festa de assassinato surpresa para o ditador César nos idos de março.
Marco Antônio

Cleópatra fugiu precipitadamente para o Egito, meditando em profundidade pelo caminho todo. Seu primeiro ato foi matar Ptolomeu, seu irmão; o segundo, foi colocar o filho de três anos de César no trono. Dois anos mais tarde apareceu Marco Antônio, governador da parte leste do império romano. A química (com um pouco de cálculo mútuo) ataca outra vez. Beberrão, atraente e ruim em relação a pormenores, Antônio desenvolveu o próprio serviço ponte aérea de garanhão, viajando entre sua esposa Fúlvia, em Roma, e Cleo, no Egito. Em 40 a.C., enquanto Cleópatra estava ocupada tendo seus gêmeos, ele estava ocupado  casando com Otávia, uma terceira esposa. Cleo preferiu ignorar esse fato, e se manteve fiel a ele como tinha sido com Júlio. Cinco anos mais tarde, ela e Marco tiveram outro filho. Para tutorar esse bando de crianças, Cleópatra contratou Filostrato e Nicolau, filósofo e historiador pesos-pesados, que se juntaram a outros pensadores, poetas e cientistas como parte de sua corte. Enquanto continuava a reinar como rainha do Egito com seu filho Cesário, ela estudou filosofia, viajou e foi às festas com Marco, desenvolveu um bócio (teria sido em razão daquelas refeições e bebidas generosas?), e ainda encontrou tempo para um pouco de leitura (um dos presentes de Marco para ela foi a gigantesca biblioteca de Pérgamo).
 
O estilo de vida luxuoso e extravagante das barcaças reais era magnífico, mas Cleo nunca perdeu seu objetivo de vista: manter o Egito tão independente quanto possível – o qual era considerado por Roma como um produtor de cereais em grande escala, convenientemente fraco e obscenamente rico. Assim, Marco e Cleo apostaram a fazenda e acabaram perdendo ambas as suas frotas para Otávio. Para adicionar injúria ao insulto, Otávio capturou o Egito para sua propriedade particular em vez de considerá-lo como uma província romana. Já estava mais do que na hora de trazer aquele áspide, pensou Cleo. Todavia, antes de morrer, ela reagiu como mãe, enviando Cesário para a Índia numa tentativa de colocá-lo a salvo. Uma outra mãe pensou nos outros filhos de Cleo: bastante estranhamente, eles encontraram refúgio com Otávia, a piedosa esposa de Marco Antônio, que os criou como seus próprios filhos.   

(*) - A próxima postagem de Mulheres Audaciosas da Antiguidade vai falar de outras CLEÓPATRAS, como a “Síria”, sua filha, a Cleópatra II, sua irmã, a III, enfim, você vai conhecer essa dinastia de mulheres que mandou durante muito tempo desde o Egito até Roma.

(**) – Do livro “Mulheres Audaciosas da Antiguidade”, título original, “Uppity Women of Ancient Times”, de Vicki León, tradução de Miriam Groeger, Record: Rosa dos Tempos, 1997.

A autora
Vicki León
 

terça-feira, 6 de novembro de 2012

A Vida é Bela

Artigo Pessoal
A Vida é Bela
Clóvis Barbosa

 
2012. Brasília completou no sábado, 21 de abril, 18 mil e novecentas e noventa e três madrugadas, manhãs, tardes ou noites. Era o seu aniversário. 52 Anos de vida de uma cidade que é um anfiteatro. Tem um crepúsculo simplesmente maravilhoso. Das minhas trezentas ou trezentas e cinqüenta viagens à capital federal aprendi a extasiar-me com o seu amanhecer, com a sua alvorada. Logo depois das 6 horas da manhã, o dia começa a surgir no horizonte. É hora de agradecer a Deus por mais um dia. A vida é bela! É hora de colocar um tênis, uma camiseta, uma bermuda, um óculos escuro, um boné e ir ao Parque da Cidade, a uns duzentos metros do Setor Hoteleiro Sul. A cidade é civilizada e os veículos param nas faixas de pedestres. Chego ao parque, passo pelo espaço infantil Ana Lídia e chego à tenda do seu Jorge, chamada “Laranja Brasil”, vizinha ao Nicolândia Center Park, autointitulado “o maior parque de diversões do centro oeste”. Como uma banana prata e outra “d’água”. Bebo uma garrafa de água mineral. Converso bobagens com os presentes e parto para uma sessão de alongamento/aquecimento. Começo a correr numa viagem que percorro há uns oito anos, depois que deixei de fumar. A viagem dura aproximadamente 7 km. Passo por oito espaços que os denomino como “Estações”, cada uma com um significado: Esperança, Desejo, Amor, Criança, Pássaro, Solidão, Sensatez e Alegria. As diligências do abismo, da insensatez, da incoerência, da hipocrisia não param nessas paradas, que é representada por um sanitário com banheiro para homem e outro para mulher, bebedouro d’água e dois bancos para cada quatro ou cinco pessoas. Um local evidentemente para descanso dos atletas.
 
Ao chegarmos aos 2 km temos o primeiro retorno pelo lado leste. Sigo em frente, passando por uma ponte em forma de arco, em direção ao segundo retorno. Chego à Praça das Fontes. É hora de parar de correr e caminhar. O fôlego não agüenta mais, embora as pernas continuem firmes. Inexplicavelmente, não consigo superar a casa dos 3 km, diferentemente de Aracaju onde corro até 8 km, Nessa viagem, passo por diversas propagandas coladas nas lixeiras: depilação a laser, farmácia de manipulação, corretagem de imóvel, sex shop, pizzaria, aparelhos celulares, Oral Estética Odontológica, Academia de Pilates. Os avisos são diversos: “Viva melhor, pratique esportes”; “Cuidado, crianças brincando no parque”; “Devagar, respeite o pedestre”; “Ciclista, proibido correr, evite acidentes”; “Ciclista, use somente a faixa da direita”; “Mantenha seu cão na coleira”; “Pedestre, use somente a faixa da esquerda”; “Água é vida”. Todo esse espaço é compartilhado com muita gente bonita, com animais silvestres, pássaros, gansos, lagos, árvores, muitas árvores, como mangueiras e jaqueiras e de todo tipo. O mais impressionante são os ninhos do oleiro João-de-Barro, o arquiteto sem diploma. Como esses pássaros conseguem construir de forma meticulosa, científica, essas casas? Os furnarius rufus, como são conhecidos cientificamente, coletam barro úmido do solo e misturam com esterco e palha. O genial é que todas as casas têm as portas de entrada posicionadas contra a chuva e o vento. Constroem as suas casas nos galhos de árvores, postes e beiradas de casas. Eles trabalham 8 a 10 horas por dia, com exceção dos domingos, construindo meticulosamente as suas casas O por quê da folga ninguém sabe explicar, e não interessa. O que vale é apreciar esse dom dado por Deus. A vida é bela!
 
Finalmente, chego ao final da minha maratona para o local do início, a “Tenda do Jorge”. Tomo um “Gatorade” e ele vai logo me dizendo: “Você, como cliente, está convidado a comparecer terça-feira, 24 de abril, às 9 horas, no Plenário da Câmara Legislativa do DF, ocasião na qual será elaborado o projeto legislativo que decidirá o plano de ocupação do parque da cidade”. Explico a ele que teria de retornar a Sergipe, mas estaria torcendo pela aprovação do projeto, cujo objetivo era o de padronizar as tendas. Na tenda, a conversa entre os atletas era a Maratona Brasília de Revezamento 2012, que seria realizado no dia 21 de abril, data do aniversário da cidade, na Esplanada dos Ministérios. “Corra da rotina e participe”, era o lema da propagada que inundava todos os pontos da capital federal. Sexta-feira, dia 20, foi o dia de entrega do kit atleta: camiseta convencional ou baby look, boné, squeeze, munhequeira de revezamento, número de peito, chip de cronometragem, mochila, manual do atleta e um vale jantar de massas. Antes de seguir para o hotel, faço alongamento. Pronto! Estou preparado para enfrentar um novo dia. Estou leve como a pluma e, como diria o compositor Paulo Lobo, na sua música A chave do mundo: “A gente não tem pressa se está bem da cabeça. Viver é um presente”.
 
Em cada cidade que viajo não deixo de levar os apetrechos da corrida e ou caminhada. Em Porto Alegre, por exemplo, gosto do Parque Moinho dos Ventos, também conhecido como “O Parcão”. É uma mistura de tudo, cães, bicicletas e muita gente, principalmente nos domingos de sol. É uma festa onde a felicidade reina. Em São Luiz do Maranhão há o parque que circunda a Lagoa da Jansen, apesar do fedor de esgoto em alguns pontos do trajeto. No Rio de Janeiro, há o calçadão que vai do Leme ao Leblon. Em Maceió, há o calçadão que vai da Pajuçara até Jatiúca, passando por Ponta Verde. E aí vai. Agora, em Aracaju, foi inaugurado o calçadão que vai da Ponte do Rio Mar até a Atalaia. Um presente para quem quer correr 10 km na ida e volta. O parque da Sementeira infelizmente não tem qualquer atrativo, apesar da teimosia dos sergipanos e dos casais jovens que acorrem para o local. A pista de caminhada/corrida é cansativa, pois, para correr ou andar 5 km você tem que dar, como peru, 3 a 4 voltas o que torna o lazer tedioso e à morrer de tédio, como diria Maiakóvski, é melhor morrer de vodca. Já dizia a poetisa Cora Coralina que o que vale na vida não é o ponto de partida e sim a caminhada. E adianta que caminhando e semeando, no fim nós teremos o que colher. É o que faço todos os dias. Caminhando e semeando. A vida é bela! Só nos resta viver.

(*) – Publicado no Jornal da Cidade, Aracaju-SE, edição de domingo e segunda-feira, 29 e 30 de abril de 2012, Caderno A, pág. 7.

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Mulheres da Antiguidade - HERAIS

Isto é história
Mulheres Audaciosas da antiguidade
HERAIS
Vicki León
 
As mentes lógicas de nossa era podem achar a crença incondicional nos antigos oráculos algo difícil de engolir. Mas, é bem possível que alguns oráculos também usassem fontes outras que não as paranormais (agentes secretos, serviço de pombo-correio) para fazer as predições. Todavia, alguns de seus espetaculares e fatídicos acertos na mosca fazem os subterfúgios parecerem improváveis.
 
Tomem como exemplo o caso de Herais, que aconteceu em torno de 148 a.C. Um oráculo de Apolo na Cilícia (parte da Turquia) disse a um ambicioso rapaz chamado Alexandre Balas “que tomasse cuidado com o lugar que originasse o ser com duas formas”. Balas guardou esse enigmático biscoito da sorte e continuou com seus afazeres de guerra, encontrando-se finalmente na Arábia, numa cidade fundada pelos gregos chamada Abae.
 
Abae significava cidade natal para uma garota chamada Herais, que recentemente havia sido dada em casamento por seu pai para Samíades, uma espécie de vendedor ambulante. Após um ano de bem-aventurança conjugal, Samíades partiu para uma viagem de negócios de um ano. Durante sua ausência, Herais ficou terrivelmente doente. Um tumor grande e doloroso começou a crescer em seu abdômen. Os médicos faziam o que podiam para amenizar sua febre e dor, sem muito sucesso. Após uma semana, a maldita coisa estourou, e um jogo completo de três peças de genitália masculina saltou para fora. Como se pode imaginar, os médicos estavam jogando golfe, portanto só a mãe de Herais e duas criadas presenciaram a transformação. Estarrecidas, elas mantiveram o segredo dentro da família. Depois de se recuperar, Herais vestiu roupas femininas normais e continuou agindo como uma dona-de-casa.
 
Finalmente, Samíades apareceu, agora ansioso para ter uma conversinha íntima de alcova. Todos lhe davam evasivas: Herais, as criadas, sua mãe e até mesmo seu pai, que estava constrangido demais para dizer a Samíades que ele agora estaria dormindo com um homem. Samíades ficou tão furioso que levou a família toda para a corte, processando o pai de Herais para que devolvesse sua esposa. O júri deu parecer favorável ao marido, dizendo que era o dever de esposa de Herais ir para a cama com ele. Herais não teve outra alternativa senão expor as evidências na corte, protestando que a lei não deveria exigir que ela coabitasse com um homem uma vez que agora também era homem. 
 
Depois que todos superaram o choque, Herais jogou umas roupas masculinas no corpo, trocou o nome para Diofanto, e se alistou na unidade de cavalaria de Alexandre Balas, para poder fazer coisas de homem, como saquear e lutar. Balas enfrentou então um pequeno retrocesso, batendo em retirada com suas tropas para Abae, onde foi assassinado por dois de seus amigos mais antigos – e, bum! Um oráculo distante marca ponto mais uma vez.
 
Enquanto isso, o bom e velho Samíades descobriu que ainda amava Herais. Como agora a ex-feminina Herais estava fora de cena, o marido caído no esquecimento e com o coração em pedaços escreveu um testamento, fez do novo e melhorado Diofanto o seu herdeiro, e se suicidou.

(*) - A próxima postagem de Mulheres Audaciosas da Antiguidade vai falar de CLEÓPATRA VII. Poliglota e sensual, tornou-se amante do imperador romano Júlio César, apesar de casada com um irmão de 12 anos. Egípcia, ela viveu nos anos 100 a.C.

(**) – Do livro “Mulheres Audaciosas da Antiguidade”, título original, “Uppity Women of Ancient Times”, de Vicki León, tradução de Miriam Groeger, Record: Rosa dos Tempos, 1997.

A Autora


quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Os horrendos crimes de mulheres

Artigos Pessoais

A natureza humana:
os horrendos crimes de mulheres

Clóvis Barbosa
 
Crime praticado por homem é a regra. Por mulheres é a exceção. Aliás, na história do crime, a mulher tem sido mais agente passiva do que ativa. Poder-se-ia afirmar, por exemplo, que o aumento de ações criminosas cometidas pelas mulheres estaria associado à conquista do seu espaço social, assumindo funções antes ocupadas por homens. Mas não é bem assim. A literatura criminal tem mostrado que a anormalidade, a extravagância e as aberrações são inerentes aos seres humanos, seja homem ou mulher. No livro “As mulheres mais perversas da história”, escrito por Shelley Klein, uma escritora e editora americana, nos apresenta quinze mulheres que praticaram crimes que mancharam as páginas da história com parricídio, fratricídio, infanticídio, assassinatos em série, mortes motivadas por sexo, vantagens pessoais ou para esconder outros ilícitos praticados.
 
As várias mulheres criminosas retratadas na obra de Klein viveram em épocas diferentes e todas ficaram famosas justamente pelos atos ignominiosos praticados. São os casos da “Lolita romana” VÁLÉRIA MESSALINA (17 d.C. - 48 d.C.), terceira esposa de Tibério Cláudio César, que depois do assassinato do seu sobrinho Calígula, em 41 d.C., tornou-se imperador de Roma. Messalina, tida como devassa, cruel e assassina, viveu e estimulou intrigas na corte levando muita gente à morte e ao desterro. Mas um dia houve a reversão do mal e ela foi apunhalada até a morte por um centurião a mando do seu marido; AGRIPINA, A JOVEM, “a rainha do veneno”, de família nobre do império romano. Ela foi a mãe do imperador Nero. Para atingir seus objetivos nunca hesitou em praticar os atos macabros e horripilantes. Era insaciável na sua sede de poder e de fortuna. A sua morte foi determinada pelo próprio filho, Nero, que não mais suportava as pressões do status quo romano que ameaçava a todo instante afastá-lo do poder por causa das atrocidades da mãe; TSI-HI (1835-1908), a imperatriz do Trono do Dragão, que viveu na China imperial. Fez parte do harém do imperador Hsien-feng, com quem teve um filho, Tsai-Chun, e que ainda impúbere se tornou imperador com a morte precoce do pai aos trinta e quatro anos. Mulher ardilosa, de uma só tacada mandou decapitar todos os prisioneiros estrangeiros e praticou crimes horrendos, sempre em busca de poder e fortuna. Morreu de derrame cerebral em 1908; CATARINA, A GRANDE, a imperatriz de todas as Rússias. Tida como fria e passional, embora nunca fosse acusada formalmente de assassinato. Em sua época mortes estranhas ocorreram, como a do seu marido Pedro III e do Czar Ivã VI. Ficou célebre pela forma desumana como tratava os servos e pelo número de homens que levava para a cama. Ela viveu de 1729 a 1796, quando morreu repentinamente.
Elena Ceausescu 

Outras mulheres tidas como perversas: a RAINHA RANAVALONA I, a Maria Sanguinária do Madagascar, uma ilha de belezas paradisíacas situada no sudoeste da África.  Casou-se com o rei Radama. No poder “mostrou as suas unhas”, isto é, a sua verdadeira índole. Tinha horror a estrangeiros, chegando ao ponto de expulsá-los da ilha deixando Madagascar isolada do mundo, e também dos que professavam a religião cristã. Quem desobedecia as suas ordens eram condenados a morrer jogados nos penhascos, queimados na fogueira ou num caldeirão de água fervente. Viveu de 1782 até 1863; ELENA CEAUSESCU, mãe da Pátria, a grande primeira-dama da Romênia, que viveu de 1919 a 1989. Acusada, conjuntamente com o seu marido Nicolae Ceausescu, do assassinato de mais de 60 mil pessoas durante 24 anos de poder. Ela foi fuzilada numa noite de Natal; LIZZIE BORDEN: solteirona carola, no dia 4 de agosto de 1892, na cidade de Fall River, em Massachusetts, EUA, matou a sua madrasta, Abby Durfree Gray, com dezoito machadadas, treze das quais lhe esmagaram o crânio. Em seguida, repetiu a dose com o seu pai, Andrew Borden, desferindo-lhe onze golpes de machados, quatro dos quais lhe esmagaram a cabeça. Lizzie foi absolvida, apesar das fortes evidências da sua autoria. Ela morreu em 1927, apaixonada loucamente por uma atriz de teatro com quem viveu os últimos anos de sua vida de opulência; AUDREY MARIE HILLEY: gastadora compulsiva, estelionatária contumaz, matou o marido, Frank Hilley, em 1975; a mãe, Lucille Frazier, em 1977, e envenenou a filha Carol Hilley, durante vários anos. Arsênico foi a substância usada para assassinar o marido e a mãe. Os crimes ocorreram em Anniston, Alabama, EUA. Foi condenada à pena de prisão perpétua. Ganhando uma licença de três dias, em 1986, aproveitou para encetar uma fuga, mas, alguns dias depois, ela foi encontrada morta, sendo a causa apresentada a exposição ao frio, resultando em hipotermia. MARY ANN COTTON, a “Viúva Negra”: quando esta inglesa nascida na pequena aldeia de Low Moorsley, no condado de Durham, morreu, em 1873, havia sido acusada pelo assassinato de quatro maridos e aproximadamente doze crianças. Era cognominada, também, de “Lucrécia Bórgia do Norte”. Usava o arsênico, um veneno para matar ratos, para aplicar em suas vítimas. 
 
Audrey Marie Hilley

Além dessas, são citadas, também, MARIE NOE, que ficou conhecida nos Estados Unidos da América como uma mãe sem sorte e foi condenada pelo assassinato de oito bebês; ROSE WEST, a inglesa da “Casa dos horrores” que foi condenada pela morte de dez pessoas, todas de forma sádica; GRACE MARKS, a adolescente fatal de Toronto, Canadá que, aos dezesseis anos, foi condenada por duplo assassinato; AILEEN CAROL WUORNOS, a amante condenada pela morte de seis homens na Flórida, todos com requintes de perversidade. Ela é conhecida como a primeira assassina serial norte-americana e sua pena de morte foi cumprida em 2002, sendo executada por injeção letal; MYRA HINDLEY, a face do mal, condenada a prisão perpétua pela prática de três assassinatos premeditados e executados a sangue-frio na Inglaterra; e KARLA HOMOLKA, condenada pela prática dos três mais violentos crimes ocorridos em Ontário, Canadá.
Marie Noe 

Quem quiser saber minúcias, as suas origens e as experiências vividas por essas mulheres, leia o livro de Shelley Klein. A verdade é que a mulher, sempre tida como mais pacífica e dosada de um senso crítico invejável, deixa-nos atônitos ao comprovar a possibilidade de um ser humano ter tanta maldade. Enfim, o cometimento de atos infames e horrendos é, de forma geral, da essência da natureza humana.

(*) Publicado no Jornal da Cidade, edição de domingo e segunda-feira, 15 e 16 de abril de 2012, Caderno A, página 7.

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Poesia - Soneto a Marcelo Déda

Poesia

Soneto a Marcelo Déda
Wanderson Andrade 
Marcelo Déda
Governador do Estado de Sergipe

Monarcas, desde outrora, crêem: vitória
Deuses concedem para iluminados.
Ou foi acaso sermos liderados
Por um trabalhador alçado à glória?

Os reis não têm vontade. Nossa história
Comprova que escolhidos são levados
Da fábrica ao palácio (e abençoados
Pela brilhante fibra na oratória).

Angústias superadas, esta terra
Entronizou quem nunca temeu guerra,
Homem de infantaria, combatente,

Que à frente dos milhões discursa, inflama.
A massa viu mudança. Agora, clama:
“Coragem, Déda. Vença novamente”.

O autor
Wanderson Bastos Andrade
(Delegado de Polícia em Sergipe)





segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Mulheres da Antiguidade - MAKARE

Isto é história
Mulheres Audaciosas da antiguidade
MAKARE
Vicki León
 
À primeira vista, a vida e carreira curtas de Makare parecem suficientemente honestas. Princesa e egípcia, ela e sua sobrinha casaram com um alto sacerdote de Amón, numa daquelas situações egípcias de ménage à trois. Makare pode ter tido que dividir um marido, mas conseguiu alguns títulos fantásticos com esse arranjo: “esposa divina do deus Amón”, “devota divina”, e “mão do deus”, que se referia à maneira com que o deus Amón trouxe seus filhos ao mundo – via masturbação. A despeito de ser casada, Makare, como devota divina, permaneceu virgem – ou deveria permanecer. Entretanto, 3.000 mil anos mais tarde, um raio X de sua múmia revelou que logo antes de morrer ela parece ter dado à luz. Isso já era excitante o bastante, mas então veio uma outra descoberta: a pequena trouxa mumificada acomodada em seu caixão, que os arqueólogos pensavam ser seu bebê, era afinal uma macaca babuína! Alguns defendem a teoria de que a primata tinha significado religioso; outros dizem que ela deve ter sido um animal de estimação. A misteriosa Makare e sua desorientadora múmia acompanhante podem não ter contado com esse tipo de imortalidade científica, mas a tiveram.

A autora
Vicki León
 
(*) - A próxima postagem de Mulheres Audaciosas da Antiguidade vai falar de HERAIS. Viveu por volta de 148 a.C. na Arábia, numa cidade chamada Abae. Casou-se com Samíades, uma espécie de vendedor ambulante. Ela foi uma mulher que se transformou em homem.

(**) – Do livro “Mulheres Audaciosas da Antiguidade”, título original, “Uppity Women of Ancient Times”, de Vicki León, tradução de Miriam Groeger, Record: Rosa dos Tempos, 1997.

domingo, 9 de setembro de 2012

O segredo de Brokeback Mountain

Artigo pessoal
O segredo de Brokeback Mountain

 Clóvis Barbosa

 
Hasan é iraquiano. Está com 30 anos. É gay assumido e vive em Bagdá. Mora isolado em sua casa com medo de ser mais uma vítima do insano e criminoso comportamento das autoridades daquele país. Vários de seus amigos, inclusive aqueles ligados à cultura “emo”, cuja maior representação é a música americana “emotional hardcore” (onde os seus adeptos usam quase sempre cabelos compridos e calças jeans justas com as cuecas à mostra), têm sido perseguidos e assassinados pela polícia e grupos paramilitares. O terrorismo contra os homossexuais iraquianos chegou ao ponto de um pai, ao descobrir a relação do seu filho com outro homem, matou-o com um tiro na cabeça. E tudo isso se deve à insensatez do governo iraquiano que, ao invés de combater o massacre dessas minorias, incita a violência. O Ministério do Interior do Iraque chegou ao ponto de veicular um comunicado, alguns dias atrás, afirmando que os “emos” são “adoradores do demônio”, estimulando, desse modo, a polícia a “eliminar” esses jovens. O anúncio foi retirado do ar; no entanto, o texto influenciou o aparecimento de vários corpos pela cidade.
 
O ódio homofóbico não é um sentimento somente do Iraque, mas do mundo inteiro. No ano passado, um relatório divulgado pelo Grupo Gay da Bahia revelava que 140 gays, 110 travestis e 10 lésbicas foram assassinados no Brasil no ano de 2010. Por faixa etária, 46% das vítimas tinham menos de 30 anos. A vítima mais jovem tinha tão-somente 14 anos; era um travesti, morto com 14 tiros em Maceió. A mais velha tinha 78 anos; era um aposentado, que foi morto com golpes de facão na cidade de União dos Palmares, Alagoas. Desses homossexuais, 43% foram assassinados a tiros; 27% morreram com golpes de faca; 18% foram apedrejados ou espancados e 12% sufocados ou enforcados. Ainda no ano passado, a polícia civil do Estado de São Paulo identificou 200 integrantes de grupos extremistas, conhecidos como “skinheads”, entre 16 e 28 anos, que são investigados por “crimes de ódio”, praticados contra gays e negros. Esses jovens estão sempre usando coturnos com biqueiras de aço ou tênis de cano alto, jeans e camisetas coladas ao peito. Cultuam o líder nazista austríaco Adolf Hitler e se cumprimentam com o grito “Heil Hitler”.
 
Consoante dados da ONU, em mais de 70 países leis criminalizam o homossexualismo, expondo milhões ao risco de detenção, prisão e, em alguns casos, execução. É lamentável. Essas normas anormais, a rigor, violam um dos princípios fundamentais que regem a nossa crença na dignidade e no valor de cada pessoa, sem distinções com base em raça, cor, sexo, idioma, religião, propriedade, nascimento ou outras quaisquer. Havendo o consentimento, toda forma de amor é válida. A história está cheia de exemplos de relacionamentos homoafetivos, como a de Gertrude Stein e Alice B. Toklas. Stein era formada em psicologia pela Radcliffe College. Viveu em Paris, onde chegou no início do século XX, e se tornou uma espécie de abelha rainha naquela época efervescente da capital francesa. Uma leva de artistas, ainda no início de carreira, fez da cidade o seu lar. Foi ela quem rotulou todos eles como a “geração perdida”. A sua obra mais importante é “a autobiografia de Alice B. Toklas”, sua amante, lançada em Paris em 1933. Ali, ela penetra nos ambientes parisienses na fase anterior à segunda Guerra Mundial, “onde reinavam a flexibilização dos costumes e a radicalização das idéias”. Ela influenciou toda essa geração de intelectuais, que passou por Paris a partir de 1903. Outra grande pioneira nessa época foi a poetisa e dramaturga Natalie Clifford Barney, uma ricaça de Ohio que foi a Paris para estudar. Depois de Eugene Stein, tornou-se a segunda mulher mais badalada daquele mundo cultural, recebendo em sua casa intelectuais da envergadura de Marcel Proust, Apollinaire, André Gide, James Joyce, Sherwood Anderson, T.S.Eliot. Suas orgias com mulheres foram cantadas e decantadas tal qual um mantra da época.
 
Federico Garcia Lorca é um dos maiores poetas de língua espanhola. Na madrugada de 18 ou 19 de agosto de 1936, aos 38 anos, ele foi fuzilado a mando da ditadura franquista em plena guerra civil espanhola. A sua condição de homossexual foi explorada pela direita espanhola como responsável pela sua morte, versão repelida pela história. Como homem das letras, travou relações com as mais importantes figuras vanguardistas do seu tempo, como o pintor Salvador Dali, com quem manteve um romance, sempre negado por este, que chegou a afirmar que Lorca “era pederasta, como se sabe, y estaba locamente enamorado de mi. Trató dos veces de ... lo que me perturbó muchisimo, porque yo no era pederasta y no estaba dispuesto a ceder. O sea que no passo nada”. Todos os biógrafos de Lorca e do próprio Dali, contudo, colocam em dúvida a veracidade dessas afirmativas. Há uma extensa correspondência existente entre ambos, onde se verificam vários trechos insinuantes, os quais demonstrariam o amor existente entre eles. Há, a propósito, um poema esparso de Lorca, que é dedicado a Salvador Dali, com o título “Ode a Salvador Dali”.
Lorca e Dali e um amigo 
Ainda no mundo cultural, um grande romance, embora conturbado, foi vivido pelos poetas franceses Arthur Rimbaud e Paul Verlaine. Os defensores do primeiro alegam que ele nunca fora homossexual; o segundo, sim. A realidade é que a relação de ambos chegou ao ponto de, após uma briga que tiveram em Londres, Verlaine ir embora para Bruxelas. Quatro dias depois, Rimbaud chegou a Bruxelas e, após nova briga, Verlaine deu um tiro no seu amante, que foi hospitalizado para extração do projetil. No julgamento de Verlaine, sob juramento, ambos negaram qualquer ligação homossexual entre eles que, segundo Verlaine, seria uma invenção de sua mulher para lhe prejudicar. Logo após a morte de Rimbaud, aos 45 anos de idade, em 1895, Paul Verlaine escreveu um texto, que denominou “Novas notas sobre Arthur Rimbaud”, onde elogiou o seu talento e festejou a amizade vivenciada entre ambos. Culminou com um poema, dedicado ao seu amante, “A Arthur Rimbaud”: “Mortal, anjo e demônio, ou melhor, Rimbaud, teu lugar no meu livro é o primeiro, como um prêmio; tu, que um bobo escritor um dia esculhambou, te achando um debochado imberbe, um verme, boêmio. As espirais de incenso e os acordes do alaúde saúdam tua chegada ao templo da memória, onde teu nome esplêndido soará em glória, pois me amavas, se preciso, até à plenitude. Serás para as mulheres, sempre, belo e forte, de uma beleza assim, agreste e sedutora, tão cobiçada quanto desvanecedora. E a história te erguerá triunfante da morte, para que, apesar de toda a lama, o mundo veja teus pés intactos sobre a cabeça da inveja”.
 
Rimbaud e Verlaine
É. Furtando as palavras de Verlaine, o problema está aí, na lama que jogam no amor homossexual, para torná-lo sujo quando, com efeito, todo amor se faz limpo, exatamente porque é amor. Essa lama tem matado no Iraque. Tem matado no Brasil. Tem tornado limpos skinheads, manchados com o sangue de quem apenas queria amar. Penso, por conseguinte, que se a sociedade respeitasse a diversidade do amor, vendo nele uma forma de contemplação sublime, superaríamos o vilipêndio dos assassinatos covardes e construiríamos um mundo único, homogêneo, leve, igual pelo respeito divino das diferenças.

(*) - Publicado no Jornal da Cidade, Aracaju-SE, edição de domingo e segunda-feira, 1° e 2 de abril de 2012, Caderno A, página 7.
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