Aracaju/Se,

terça-feira, 10 de abril de 2012

Isto é história
Mulheres Audaciosas da antiguidade
FERETIMA

Vicki León

Sítio Arqueológico de Cirene

Até a chegada dos tempos modernos, as pessoas de certa forma esperavam que a morte viesse cedo e/ou fosse dolorosa. Por exemplo, Heráclito, um famoso filósofo do século VI a.C., tentou curar sua hidropisia enterrando-se em esterco até o pescoço, depois do que cachorros das redondezas o acharam irresistível e o devoraram. É difícil sobrepujar um registro de partida tão espetacular como esse, mas é possível que o horrível final de Feretima, uma contemporânea sua, chegue perto.

Heráclito
Ela era a primeira-dama de Cirene, uma área fértil e pitoresca ao longo da costa da África do Norte, colonizada havia cem anos por ilhéus de Tera encorajados pela profetisa do oráculo de Delfos: “Clima maravilhoso, vocês vão adorar”. O lado negativo era que Feretima era casada com um rei azarado chamado Battus. A ineficácia era literalmente uma característica de sua família, em quase todos os sentidos. Embora vivessem num pedaço de paraíso, sob sua administração inepta tudo dava errado. Quando ele morreu, a rainha Feretima e seu filho Arcesilau tentaram reverter suas ações, o que levou à guerra civil. O filho fugiu para um lado, e Feretima fugiu para o norte rumo à ilha de Chipre, onde ela gentilmente pediu ao rei que lhe cedesse um exército para reconquistar seu trono. Ele respondeu rudemente à sua solicitação, enviando-lhe um jogo de utensílios de ouro para tecelagem de lã – seu conceito de gracejo sobre “trabalho feminino”. Enquanto isso, o filhinho havia arrebanhado um exército em outro lugar; entretanto, antes de partir em direção à cidade capital de Cirene, ele deu uma parada no oráculo de Delfos onde recebeu uma atualização paranormal (será que eles tinham uma conta aberta, ou o que?). Ele ignorou o oráculo, que lhe disse para não prosseguir, e foi assassinado pontualmente quando entrou em Barca, uma cidade de Cirene.

Embora sua vida tivesse voltado ao normal, Feretima foi forçada a largar tudo e fugir outra vez. Dessa vez ela se dirigiu ao Egito e convenceu seu líder a ajudá-la a fazer um cerco a Barca; Feretima enviou uma mensagem a seus cidadãos dizendo: enviem-me o criminoso que matou meu filho, ou a barra vai ficar pesada: “Todos nós o matamos”, responderam aqueles malditos barcanos. O cerco foi mantido por nove meses sombrios. Finalmente, os persas, que desejavam a paz em Cirene para que pudessem fazer alguns negócios de mineração, atuaram como mediadores e entregaram os culpados a Feretima. Ela poderia ter sido magnânima, mas não... Naquele ponto, num estado de irritação ardente, ela decidiu redecorar a cidade, adornando suas paredes com estacas que exibiam as cabeças empaladas dos assassinos e os tórax de suas esposas. Para bisar, ela deixou que os persas pilhassem e escravizassem os barcanos.

Depois do banho de sangue em Barca, Feretima fez uma retirada discreta para o Egito. Mas ela simplesmente não estava destinada a relaxar, desfrutar sua aposentadoria, e viver de velhas lembranças. Em vez disso, ela adoeceu com uma enfermidade tão horripilante que os gregos nem mesmo tinham um nome para ela (nós também não temos). Seu corpo começou a fervilhar com vermes, que a devoraram enquanto ela ainda estava viva, até o último pedaço.

(*) - A próxima postagem de Mulheres Audaciosas da Antiguidade, vai falar de ARSÍNOE, a mais audaciosa política da Macedônia. Foi casada com Lisímaco, rei da Trácia. Depois da morte deste, casou-se com um seu meio-irmão, rei da Macedônia e, depois, casou-se com o seu irmão Ptolomeu II, faraó do Egito. Tornou-se deusa e teve cidades renomeadas com o seu nome.

(**) – Do livro “Mulheres Audaciosas da Antiguidade”, título original, “Uppity Women of Ancient Times”, de Vicki León, tradução de Miriam Groeger, Record: Rosa dos Tempos, 1997.

A autora
Vicki León

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