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domingo, 1 de maio de 2016

Greve de sexo

Opinião pessoal
Greve de sexo
Clóvis Barbosa
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Já se disse, por diversas vezes, que não há poder sem sedução. Diane Ducret, jornalista francesa, escreveu um livro, As mulheres dos ditadores, onde conta a participação das mulheres na vida de grandes nomes que fizeram a história do século XX. Na obra, são encontrados três tipos de mulheres: as que amam o homem mais que a sua própria vida; as que vêem nele a encarnação de seus ideais; e as que amam o poder. Embora seja abordado o lado estritamente masculino (as manias e a necessidade de passar uma imagem de sedutor), é flagrante a influência feminina no modo de agir desses personagens. Mussolini, o Duce, por exemplo, malhava duas vezes ao dia e tinha prazer de exibir o corpo em trajes de banho. Isto angariava admiradoras de toda a Europa; Salazar, em Portugal, gostava de passar a imagem de um homem jovial, sedento por sexo, conhecido como um playboy religioso; Stalin tinha tanto apego ao poder que se esqueceu de usar a arte da sedução, até porque ele era tido como um homem complexado; o romeno Nicolae Ceausescu nem pensava em explorar politicamente esse viés, uma vez que era um homem completamente dominado pela mulher Elena, A mãe da pátria; e Hitler, no poder, mudou a sua forma de vestir e usou as mulheres da alta sociedade como personais estilistas e adorava fotos em poses que o imortalizasse, chegando ao ponto de receber mais cartas de fãs do que Mick Jagger e os Beatles juntos. Mas o tema que pretendo enfrentar hoje é o da utilização da relação sexual como instrumento de chantagem, de persuasão e de reivindicação praticado pela mulher. Já abordei esse tema em ensaio de 2012, neste mesmo espaço, com o título Mulheres de Atenas. Mas como a obra de Aristófanes, Lisístrata, embora escrita no século V, antes de Cristo, continue influenciando a humanidade, caso agora da Criméia, onde as mulheres ucranianas tentam boicotar sexualmente os homens russos, torno ao assunto.
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Em represália à anexação da Criméia pela Rússia do presidente Vladimir Putin, elas iniciaram uma campanha com o slogan, contido em camisetas, “Não transe com um russo”, escrito em alfabeto lirílico, cujo logotipo contém duas mãos em concha, lembrando uma vagina. A campanha foi lançada nas redes sociais e está causando o maior rebu. “Precisamos enfrentar o inimigo da melhor maneira possível”, disse uma organizadora do movimento. “Tentamos fazer isso de forma provocativa porque atrai a atenção”, afirma Irene Karpa, escritora, blogueira e musicista ucraniana. Segundo ela, a frase é uma versão moderna de um verso do poeta popular ucraniano Taras Shevchenko, que diz: “Apaixone-se donzelas de sobrancelhas escuras, mas não por um russo”. Ao contrário de outras partes do mundo em que as campanhas imitam o exemplo de “Lisístrata”, onde as mulheres tentam impedir a participação de seus homens em guerras, na Criméia, as mulheres querem boicotar os invasores de sua terra, evitando-se a prática de sexo com estes. Em 2006, na Colômbia, diante dos conflitos sangrentos entre gangues, as esposas e amantes dos líderes iniciaram uma greve de sexo, numa concatenação de idéias que terminou na reunificação dos contendores. Mais tarde, foi a vez de trezentas mulheres da cidade colombiana de Barbacoa fazerem a sua greve de sexo, a qual  movimento chamaram de “pernas cruzadas”. Durante três meses e dezenove dias, nada de sexo com os seus maridos. Só pararam quando o governo se comprometeu a pavimentar uma velha estrada construída no século XIX. No Quênia, em 2009, as mulheres pararam suas relações sexuais até verem a reconciliação entre o presidente e seu primeiro-ministro, evitando-se uma crise política que poderia trazer prejuízos nefastos ao país. Ainda na África, mulheres togolesas fizeram uma greve de sexo durante uma semana, manifestando a sua indignação contra o governo de Faure Gnassingbé.
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O problema é que Gnassingbé está no poder com a sua família há mais de quarenta anos e o país continua sendo um dos mais pobres do continente africano. Apesar da existência de eleições, os homens têm sido subservientes. E as mulheres usam da abstinência sexual para obrigar seus maridos, irmãos, amantes a participarem do movimento de derrubada do regime. Como se observa, a estratégia das mulheres em fechar as suas pernas tem dado resultados. Aliás, quem aguenta ficar muito tempo sem sexo? Foi o caso de um queniano que processou um grupo de ativistas que promoveu uma greve de sexo. Na Alta Corte de Nairóbi, ele disse que a sua mulher aderiu à greve de sexo e isso fez com que, durante a paralisação, ele sofresse de agonia, estresse, dores nas costas e falta de concentração. Os sexólogos defendem a tese que a abstinência sexual masculina produz consequências de natureza psíquica, como a baixa auto-estima, depressão e melancolia. Contudo, tem pessoas que enfrentam o problema na intimidade de sua alcova, transformando-se em amante de si mesmo. Wood Allen diz: “Eu sou um bom amante porque pratico muito comigo”. Mas o importante deste enfoque é justamente aquilo que pode causar de ruim no psíquico do homem. As mulheres de Atenas, imaginadas por Chico Buarque, seriam uma ficção ou uma realidade? Vejam: elas vivem pros seus maridos (...) e quando amadas, se perfumam, se banham com leite, se arrumam e quando fustigadas, não choram, se ajoelham, pedem, imploram. Sofrem pelos seus maridos (...). Quando eles embarcam, soldados, elas tecem longos bordados. E quando eles voltam sedentos, querem arrancar violentos, carícias plenas, obscenas. Quando eles se entopem de vinho, costumam buscar o carinho de outras falenas, mas, no fim da noite, aos pedaços, quase sempre voltam pros braços de suas pequenas Helenas”. Se isto for realidade, não é fácil enfrentar uma greve de sexo.   
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Logo, é preciso que entendamos que para se ter amor é preciso ter paz. E o grande exemplo de Lisístrata e dessas mulheres que fazem greve de sexo é que é preciso pensar menos na escuridão dos conflitos e pensar mais na brancura do amar.

Retratos da Vida
Jean Pierre, o homem que sabia demais
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Jean Pierre não é o seu nome de batismo. Afrancesou por achar chique. Culto, gostava de citar exemplos de grandes vultos da história, literatura, cinema, política e de toda atividade humana que tinham a mesma opção sexual. Era capaz de convencer qualquer pessoa sobre as suas teses, sempre argumentada com uma riqueza de informações. Sua mãe tinha orgulho da sua educação, da sua delicadeza e da coleção de calcinhas de mulheres que ele guardava no seu guarda-roupa. Quando perguntada sobre as calcinhas, ela sempre respondia: - cada uma dessas pertenceu a um caso amoroso de Jean Pierre. Ele é um sucesso com as mulheres. Não se prende a nenhuma. Mas o bom dele mesmo era o seu poder de persuasão nas discussões. Certa noite, no Museu da Gente, ele chamou a atenção de todos que estavam no restaurante. Dizia com altivez que o pintor Salvador Dalí teve um caso com o poeta Federico Garcia Lorca. – Eles foram amantes, sim! Eles se conheceram em Madri e tornaram-se inseparáveis, ao lado, também, de Buñuel e Pepin Bello. Um interlocutor, Josué, que participava da discussão, chegou a citar em espanhol uma frase de Dalí, retrucando os comentários de que mantinha um relacionamento amoroso com o poeta andaluz, Lorca: “era pederasta, como se sabe, y estaba locamente enamorado de mi. Trato dos veces de... lo que me perturbo muchísimo, porque yo no era pederasta y no estaba dispuesto a ceder. O sea que no passo nada”. Jean Pierre não gostou da contestação oferecida e, sacando do bolso um pequeno livreto, passou a recitar um poema de Lorca dedicado ao pintor catalão, denominado “Ode a Salvador Dalí”: “Uma rosa no alto jardim que tu deseja. Uma roda na pura sintaxe do aço. Desnuda a montanha de névoa impressionista. Os grises observando suas balaustradas últimas”. Dava ênfase em alguns versos: “Oh Salvador Dalí, de voz azeitonada! Digo o que me dizem a tua pessoa e os teus quadros. Não te louvo o imperfeito pincel adolescente, mas canto a firme direção de tuas flechas. (...)” E arrematou, todo se contorcendo e com jogo de mãos que causaria inveja a uma singela dama, inquiriu Josué se ele tinha ou não razão, e continuou: “Mas antes de tudo canto um comum pensamento que nos une nas horas escuras e douradas. Não é Arte a luz que nos cega os olhos. É primeiro o amor, a amizade ou a esgrima”. Numa mesa vizinha ecoaram palmas com gritos lancinantes de bravo! Bravo! Josué calou-se e quedou-se inerte aos argumentos de Jean Pierre.              

- Publicado no Jornal da Cidade, Aracaju-SE, edição de domingo e segunda-feira, 13 e 14 de abril de 2014, Caderno A-7.

- Postado no blog Primeira Mão, em 16 de abril de 2014, quarta-feira, às 18h18min, sítio: 
 http://www.primeiramao.blog.br/post.aspx?id=7394&t=greve-de-sexo

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