Aracaju/Se,

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Imprensa - O 4° Poder

Os crimes que abalaram Sergipe

17/Imprensa, o 4° poder
Acrísio Torres (*)

Joaquim Pereira Lobo
Presidente de Sergipe em 1921
Era quase meio-dia de 3 de outubro de 1921. Mal terminava a impressão do Jornal do Povo, órgão de oposição, dez policiais à paisana, de revólver em punho, invadiram a redação e oficinas, como verdadeiros vândalos. O intuito era assassinar o seu diretor, dr. Manoel Nobre, que escapou passando-se para a casa vizinha. Os esbirros, a mando de Pereira Lobo, presidente do estado, penetraram no jornal aos gritos, furiosos, e a indagar “onde está o bandido do Nobre?” Não conseguiram satisfazer sua intenção criminosa. Por isso, esbordoaram empregados das oficinas, reviraram pranchas e tipos. Depois, retiraram-se, mas voltariam à noite com o fim de empastelar o jornal. Estava amordaçada a imprensa. Teve o fato grave repercussão em Aracaju, em todo o estado, no país. Pereira Lobo não admitia censuras à sua administração. Daí o plano sinistro, que traçou e mandou executar. Não assumiu, porém, a responsabilidade dos atentados. Pelo contrário, cinicamente, a imprensa do governo insinuou que o atentado não passara de uma encenação, preparada pelo dr. Manoel Nobre. Dissera mesmo tratar-se de uma farsa, para esconder a má situação financeira do jornal.

Mentiam os órgãos governistas. Tanto que, quando o fato repercutiu fora do estado, verberado da tribuna parlamentar, no congresso nacional, os órgãos oficiais mudaram de tática, e passaram a noticiar que a suspensão do Jornal do Povo se dera em vista de greve dos tipógrafos. A intervenção do governo, diziam, visara apenas garantir o dr. Manoel Nobre, o diretor, e seus redatores, por meio da polícia. Vê-se que Pereira Lobo admite a “intervenção” da polícia, que negara antes. Mas, era julgar o povo sergipano inconsciente, incapaz de apreciar fatos e homens. Não era difícil perceber a contradição do governo sergipano, contradição que mais fortalecia a posição do órgão de oposição. Por isso, o Jornal do Povo não deixou a estacada, na obra empreendida em prol de Sergipe. Havia uma decisão de incomum coragem, no diretor, dr. Manoel Nobre, e nos jornalistas Costa Filho e Virgínio de Sant´Anna, redatores. Proclamavam que ainda que o governo insistisse no propósito de amordaçar a imprensa, ainda assim o Jornal do Povo não deixaria de existir. E se impossível a sua publicação em Sergipe, por motivo de violências oficiais, ele seria impresso em outro estado, onde houvesse liberdade de imprensa.

Unicamente num caso isso não seria possível, isto é, no caso de que Pereira Lobo mandasse fuzilar a todos sumariamente. Protestos de solidariedade e manifestações formais de condenação aos processos de violências usados pelo governo, chegaram ao jornal e seus redatores, e diretor, de todas as partes. Telegramas do Rio, de São Paulo, da Bahia, de Pernambuco. Todos condenando as violências, e defendendo a liberdade de imprensa violada por Pereira Lobo. No Rio, O Avante, jornal de Maurício de Lacerda, publicava que “Pereira Lobo mandara invadir por soldados à paisana o Jornal do Povo, de Aracaju”. E acrescentava que “tipógrafos foram espancados, e o diretor, dr. Manoel Nobre, foragido e ameaçado de morte”. E concluía que “começava o cangaço nas terras de Sergipe, infâmia que se estende do Palácio do Catete aos palacinhos dos governichos estaduais”. Não é outra a linguagem do Correio da Manhã, ao dizer que o Jornal do Povo é “em Aracaju o órgão de reação republicana, sustentando a propaganda eleitoral em favor das candidaturas Nilo-Seabra”. E acrescentava que “essa atitude irritou o governismo local, amarrado como tantos outros, aos compromisso criados pela famosa combinação Bernardes”. Daí as violências contra o diretor e redatores do Jornal do Povo.

Jornal A Noite
Rio de Janeiro
No mesmo diapasão se manisfestava A Noite, do Rio. Também o Jornal do Brasil, fazendo graves considerações em torno do atentado contra o Jornal do Povo. Dizia o grande jornal que não precisava de “comentários para mostrar bem claro como vai em Sergipe a liberdade de imprensa; o órgão amordaçado defende a politica da dissidência, e daí a violência praticada”. Eram, na verdade, os estertores do despotismo. Não só na imprensa do país repercutiu o atentado contra o Jornal do Povo. Teve graves repercussões também na assembleia fluminense, mais grave ainda no congresso nacional, neste através de vários pronunciamentos do senador Vespúcio de Abreu. Tudo isso levou ao habeas-corpus concedido ao Jornal do Povo, pelo então Tribunal de Relação, hoje de Justiça, deste estado, Ficava, assim, assegurado o direito de livre manifestação do pensamento. Uma vitória da Jornal do Povo. Uma vitória da imprensa livre.

(*) - Do livro Sergipe/Crimes Políticos I, Cenas da vida sergipana 2, autoria de Acrísio Torres, Thesaurus Editora, prefácio do jornalista Orlando Dantas, páginas 69 a 71. 

- Nova postagem de cenas da vida sergipana no dia 28 de dezembro de 2010. Vai abordar, em nove séries, a história de Mata Escura, um criminoso sergipano que foi condenado a morrer enforcado, tudo de acordo com o autor e obra acima. 

Um comentário:

  1. Muito interessante o artigo. Mostra que os ataques à imprensa brasileira se repete em vários momentos históricos e de várias maneiras.

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