Aracaju/Se,

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Cavaco Silva e a lição da morte política

Artigo pessoal

Cavaco Silva e a lição da morte política
Clóvis Barbosa

Cavaco Silva
Presidente de Portugal
Vindo de Barcelona, cheguei em Lisboa na sexta feira, dia 21 de janeiro. Estava ansioso para assistir as eleições presidenciais em Portugal, que seriam realizadas no domingo, 23 de janeiro, onde seis candidatos disputavam a hegemonia do poder presidencial no país luso: Aníbal Antônio Cavaco Silva, 71, Presidente desde 2006, com o apoio do Partido Social Democrata, do CDS – Partido Popular e do Movimento Esperança Portugal; Defensor de Oliveira Moura, 65, independente, deputado do Partido Socialista; Francisco José de Almeida Lopes, 55, pelo Partido Comunista Português e pelo partido ecologista “Os Verdes”; José Manuel da Mata Vieira Coelho, 58, deputado pelo PND e apoiado pelo partido Nova Democracia; Manuel Alegre de Melo Duarte, 74, apoiado pelo Partido Socialista, pelo Bloco de Esquerda e pelo Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses; e Fernando de La Vieter Ribeiro Nobre, 60, candidato independente. No domingo, a cidade de Lisboa estava calma, nem parecendo que estávamos num dia de eleições. A temperatura oscilava entre 6 C° e 8º. Em Madragoa, São Bento, Alto do Pina, no Chiado, Rossio, Belém e outros bairros da velha Lisboa, o ambiente era de total silêncio em relação às eleições. Nas sessões eleitorais, o clima era de plena tranqüilidade e a conversa era só uma, a abstenção em massa. Tentei mostrar a alguns eleitores a importância da participação popular no processo de escolha do Presidente da República.


Lisboa, vista do Rio Tejo
Replicando, alguns disseram que não adiantava nada, porque o presidente se comportava como um monarca inglês. Não mandava em nada, alternando o comando do Estado, entre o primeiro-ministro, que é o chefe do governo, Banco Central Europeu, responsável pela moeda única da zona euro, e que na sua missão de assegurar o poder de compra da moeda, prejudicava imensamente a soberania do estado português, e, ainda, o parlamento europeu, que é quem dita as normas aos países do continente. Outros, porém, concordavam em votar. A cidadania exige a participação ativa do cidadão na vida do seu país, do seu estado, do seu município, do seu condomínio, em todos os campos da atividade humana. O voto, por sua vez, possui uma simbologia singular, que é o de oportunizar ao cidadão a participação nos destinos da sua comunidade, de sua nação, e de sua história. Portanto, o estado democrático só se concretiza com a verdade eleitoral, ou seja, a participação dos eleitores no processo de escolha dos seus representantes. Daí a minha surpresa com o resultado das eleições. A abstenção foi histórica: 53,37% dos portugueses não foram as urnas, permitindo que a minoria reelegesse o Presidente Cavaco Silva que, dos 46,63% dos votantes, obteve a vitória esmagadora de 52,94% contra 47,1% de todos os cinco candidatos juntos.

José Sócrates
1º Ministro Português
Os analistas afirmam que um dos motivos da abstenção foi a entrada em vigor do cartão único, ou cartão do cidadão, que dentre outros números, modificou o do título eleitoral, o que dificultou a sua procura pelo eleitor, fazendo com que muitos desistissem de cumprir o seu dever de votar. Quanto ao vencedor, Cavaco Silva, reeleito para a presidência de Portugal, somente terá desafios pela frente num país que viu decrescer a atividade econômica em 2010, prenunciando uma crise de grandes proporções. No mês de abril, segundo os analistas, quando se conhecerem os dados da execução orçamentária do primeiro trimestre, é que poderá ocorrer uma reviravolta na política portuguesa, falando-se até na dissolução da Assembléia da República, cuja minoria socialista com o apoio dos sociais-democratas administram o País na pessoa de José Sócrates, o primeiro-ministro. Sim, antes que esqueça, nos termos da Constituição Portuguesa, o regime lá é semipresidencialista. A administração do Estado é feita pelo governo, representado por um primeiro-ministro, que é nomeado pelo Presidente da República, tendo em conta os resultados das eleições para a Assembléia da República e o nome é indicado pelo partido mais votado nesse escrutínio. O nome de José Sócrates foi escolhido justamente porque a oposição à Cavaco Silva foi a vitoriosa nas eleições da Assembléia da República nas últimas eleições.


Defensor Moura
O lanterninha das eleições

Mas, afora isso, fiquei impressionado com o depoimento de Defensor Moura, o lanterninha, que obteve apenas 1,6% dos votos: “não felicito quem ganhou”. Em política é preciso saber perder, saber, inclusive, morrer. Dizia Churchill: “Política e guerra são igualmente excitantes e perigosas. Acontece que, na guerra, morremos uma única vez, enquanto que, na política, morremos inúmeras”. Esse é o inevitável problema da política: saber morrer. Churchill soube. E é isso que distingue os fracos dos fortes. Estes aceitam a derrota, mesmo que injusta; aqueles não a querem, mesmo quando a merecem. Todos sabem que se não fosse Churchill, o mundo hoje poderia estar nas mãos do nazi-facismo. Todavia, Churchill venceu a guerra. Com a derrota da Alemanha, em 1945, o planeta retomou seu curso e Churchill, vitorioso, candidatou-se à recondução como premiê, na certeza de que o parlamento inglês reconheceria sua grandeza. Mas, ele perdeu. Sobreviveu à grande guerra, mas morreu (temporariamente) na política, perdendo o pleito para o trabalhista Clemente Attlee. O que fez Churchill? Xingou Attlee? Não. Digeriu a derrota e recolheu-se. O resto da história todos sabem, Churchill concluiu a sua obra (Memórias da 2ª, Guerra Mundial), o que lhe rendeu o Nobel em 1953. Concluindo, com a sua derrota, Churchill também saiu vencedor. Tanto que, em 1951, já com 76 anos, retomou ao cargo de primeiro-ministro. É assim que as coisas funcionam na política.

- Publicado no Jornal da Cidade, Aracaju-SE, edição de domingo e segunda-feira, 30 e 31 de janeiro de 2011, Caderno A, p. 7.


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